“Glória Feita de Sangue”: um clássico da guerra de argumentos

Thiago Cantarin Moretti Pacheco

“Glória Feita de Sangue” (1957) é apenas o quarto filme da longa carreira de Stanley Kubrick. Também co-roteirizado pelo diretor, é baseado no livro homônimo do escritor ítalo-canadense Humphrey Cobb. A história é a de um regimento francês durante a primeira guerra mundial. 

Ordens do generalato mandam a unidade avançar sobre um trecho particularmente perigoso da terra de ninguém. Após tentativas frustradas, com muitos soldados colhidos pelas baterias e metralhadoras inimigas, a tropa, ciente da futilidade do ataque, se recusa a cumprir o comando. Furioso, o General Mireau (George Macready), que havia ordenado a operação, chega a dar ordens para a própria artilharia francesa atacar a posição de seus soldados, de modo a fazê-los avançar. Quando essa ordem não é cumprida, o oficial se recompõe e é convencido por colegas a adotar outra solução: submeter os soldados a uma corte marcial por covardia. O general primeiro deseja que nada menos que cem soldados sejam acusados – mas, como a pena para covardia é o pelotão de fuzilamento, acaba se contentando em acusar apenas três, um escolhido em cada companhia do regimento.

Assim é que, para a defesa dos soldados acusados, se voluntaria o Coronel Dax (Kirk Douglas), o próprio comandante do regimento em questão e que era advogado na vida civil. Tocado pela responsabilidade por seus homens, e ciente de que, em última análise, a recusa ao ataque suicida seria atribuída a ele (sem falar na pena a ser aplicada aos soldados), Dax se dedica apaixonadamente a defender seus comandados.

O julgamento, no entanto, é um jogo de cartas marcadas – nem toda a habilidade de Dax consegue salvar os pobres recrutas, que acabam fuzilados após o desrespeito a todas as regras e garantias que deveriam ser observadas, mesmo em uma corte marcial. No fim das contas, fica um gosto amargo e a constatação de que não apenas ataques suicidas são um morticínio fútil, mas a guerra como um todo – ponto de vista, é claro, que viria a ser vigorosamente questionado pela próxima guerra mundial. A contraposição entre essas duas realidades – a da guerra ora como um conflito evitável e produto de mera degeneração da política; ora como atividade necessária diante de circunstâncias extraordinárias – é representada pelo próprio embate entre a pretensão punitiva do General Mireau e a defesa do Coronel Dax. Dessa síntese, espera-se, algo de melhor pode surgir. 

Denúncia vazia de locação pode ser comunicada por e-mail

Cassiano Antunes Tavares

Em dezembro passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a comunicação para rescindir locação por prazo indeterminado poderia se operar por e-mail.

Nos termos do artigo 6º da Lei de Locações de Imóveis Urbanos, “o locatário poderá denunciar a locação por prazo indeterminado mediante aviso por escrito ao locador, com antecedência mínima de trinta dias.”

Assim, o recurso julgado no STJ (REsp 2.089.739) tinha como principal objeto determinar qual o modo em que este aviso deve ser realizado. Com farta fundamentação, entendeu-se que não há maiores formalidades, bastando que a comunicação seja escrita, idônea e suficiente. No caso, por e-mail.

O advogado, Cassiano Antunes Tavares, destaca que o entendimento se trata de uma situação peculiar e específica, como frisado na própria decisão. Ainda, comenta que este tipo de expediente deve ser considerado como exceção, pois o mais recomendável é mesmo optar pelo meio mais formal para evitar discussões casuísticas. 

Domicílio Judicial Eletrônico: Prazo até 30 de maio para cadastro das empresas de Médio e Grande Porte.

Michelly Ançay

O Domicílio Judicial Eletrônico – DJE, ferramenta do Programa Justiça 4.0 desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tem como objetivo centralizar as comunicações processuais enviadas por todos os tribunais do país (com exceção do Supremo Tribunal Federal), em uma única plataforma digital. 

Atualmente, as comunicações processuais acontecem de diversas formas: através de oficial de justiça, correios, diário de justiça, bem como pelos portais de cada tribunal. A ferramenta pretende facilitar o acompanhamento das citações, intimações e outras comunicações processuais, além de proporcionar a diminuição de gastos com correios e, também, com diligências dos oficiais de justiça.

É importante destacar que o sistema não se aplica para comunicações processuais no âmbito de processos administrativos (Prefeituras, Receitas Estaduais e Receita Federal).

Quem deve se cadastrar no DJE?
Qual é o prazo para a realização do cadastro?

O cadastro é facultativo para pessoas físicas, bem como para as microempresas e empresas de pequeno porte que possuem endereço eletrônico no sistema integrado da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim).

No entanto, o cadastro é obrigatório para as empresas privadas de médio e grande porte, bem como para as microempresas e empresas de pequeno porte que não possuírem cadastro no sistema integrado da Redesim, e deve ser realizado até o dia 30 de maio de 2024. A partir de 31 de maio, o cadastro será feito de forma compulsória, a partir de dados da Receita Federal. 

Como o DJE está vinculado com a base de dados da Receita Federal, a identificação do porte da empresa é obtida junto ao CNPJ cadastrado perante a RFB, utilizando como critério a receita bruta anual:

Empresa de Grande Porte: superior a R$ 20.000.000,00;
Empresa de Médio Porte: igual ou inferior a R$ 20.000.000,00;
Empresa de Pequeno Porte: igual ou inferior a R$ 4.800.000,00;
Microempresa: igual ou inferior a R$ 360.000,00.

Como é feito o acesso ao DJE?

O acesso ao sistema é realizado através de certificado digital ou conta gov.br, por meio do endereço da  Plataforma Digital do Poder Judiciário.

Além disso, para acessar o sistema via gov.br é preciso que a conta tenha nível prata ou ouro. E, através do certificado digital, é necessário que o software PJeOffice esteja instalado na máquina. O passo a passo para a instalação do PJeOffice está disponível clicando aqui.

Como realizar o cadastro no DJE?

O primeiro passo a ser realizado é o login da empresa. Como as informações cadastrais são recuperadas da base da dados da RFB, é muito importante conferir tais dados, antes de seguir com a leitura e assinatura do termo de adesão ao sistema. 

Havendo alguma inconsistência nas informações cadastrais, o recomendado é seguir com a atualização perante a RFB, antes de prosseguir com o cadastro no DJE. E, para a finalização do procedimento, é preciso preencher informações sobre a pessoa física responsável pela empresa. Ou seja, o representante da empresa. 

No momento do cadastro da empresa e informação quanto ao seu representante, será necessário informar o e-mail habilitado para receber as notificações do sistema. Ou seja, todas as notificações de comunicações processuais serão enviadas ao e-mail informado. Por essa razão, recomendamos não cadastrar o e-mail utilizado usualmente, já que o DJE vai encaminhar vários e-mails, lotando a caixa de entrada. Sugerimos a criação de um e-mail específico para fins de recebimento de avisos e comunicações processuais relacionadas ao DJE.

Além disso, o cadastro da matriz permite a vinculação dos CNPJs das filiais e coligadas, com o respectivo acesso e gerenciamento das comunicações processuais expedidas a elas. A não vinculação não impede que cada filial e coligada acesse individualmente o DJE. Ou seja, esse é um recurso disponível para auxiliar no compartilhamento de dados das comunicações processuais entre empresas parceiras.

Também é possível cadastrar usuários para acesso ao perfil da pessoa jurídica, concedendo um perfil de acesso para uma pessoa física, que poderá acessar o sistema da empresa com login individual. 

Quais são os perfis?

Administrador: possui acesso à todas as funcionalidades do sistema, bem como a gestão de usuários. Responsável pelo CNPJ da instituição. Para instituições privadas, este perfil tem disponível a função de cadastrar filiais e coligadas;
Gestor de Cadastro: acessa as comunicações processuais e pode gerenciar o cadastro de prepostos;
Preposto: podem acessar as comunicações processuais. Mas, não podem gerenciar outros usuários.

Cabe lembrar que todos os perfis possuem acesso à função Comunicação Processual. O que difere são as permissões para a leitura, ou não, do inteiro teor da comunicação, com o respectivo registro da ciência.

Quais são as eventuais sanções para as empresas cujo cadastro é obrigatório na plataforma?

Além de atraso em processos, o não cadastramento poderá incorrer na perda do prazo processual, tendo em vista que haverá a ciência tácita automática da intimação no prazo de 10 dias corridos a partir da sua expedição no DJE. Já o prazo para a leitura das citações é de 3 dias úteis após o envio no DJE.

Caso não seja acusado o recebimento das citações no DJE, as mesmas serão realizadas pelas vias tradicionais, como Oficial de Justiça e AR.

O descumprimento das regras também pode trazer prejuízos financeiros, tendo em vista que, tratando-se de citação, quem deixar de confirmar o seu recebimento via DJE no prazo legal e não justificar a ausência, estará sujeito a multa de até 5% do valor da causa por ato atentatório à dignidade da Justiça, salvo se apresentada justa causa na primeira oportunidade de falar nos autos.

Veja abaixo quais são as 6 possibilidades de status na comunicação processual:

Por fim, as empresas que já possuem sistemas próprios de acompanhamento de comunicações processuais podem conectá-los ao DJE via API (Interface de Programação de Aplicação: mecanismo de integração que possibilita a comunicação entre plataformas).

O Conselho Nacional de Justiça criou uma série de vídeos explicativos sobre a ferramenta clique aqui.

Ainda, em caso de dúvidas adicionais, a instituição também preparou um FAQ e Manual do Usuário.

Eventuais dúvidas sistêmicas também podem ser sanadas através do e-mail sistemasnacionais@cnj.jus.br.. Ou, através do contato telefônico do suporte do DJE, disponibilizado pelo CNJ: (61) 2326-5353.

A equipe de Prolik Advogados permanece disponível para assessorar em questões relacionadas ao Domicílio Judicial Eletrônico, seja esclarecendo dúvidas ou havendo necessidade de algum tipo de orientação.

Nova Lei impacta na eficácia dos Negócios Imobiliários

Eduardo Mendes Zwierzikowski

A Lei nº 14.825, de 20 de março de 2024, alterou o art. 54, da Lei nº 13.097/2015, para garantir a eficácia dos negócios jurídicos relativos aos imóveis em cuja matrícula inexista averbação, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição, inclusive aquelas provenientes de ação de improbidade administrativa de hipoteca judiciária.

A lei alterada pela nova norma contém previsões sobre os registros nas matrículas imobiliárias e já garantia eficácia aos negócios jurídicos realizados entre particulares, quando inexistente a averbação da existência de ações judiciais relativas ao imóvel ou que pudessem implicar na insolvência do proprietário.

O que a Lei 14.825 trouxe de novidade foi a ampliação da proteção legal às transações imobiliárias, que não poderão ser desconstituídas quando ausente na matrícula a averbação de qualquer tipo de constrição, como penhoras, arrestos, sequestro de bens ou inclusão do nome do proprietário no Cadastro Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB).

Essas previsões prestigiam a segurança jurídica dos negócios imobiliários e conferem especial importância à análise cuidadosa das matrículas, essencial para garantir proteção ao adquirente de boa-fé.

Quanto vale uma vida?

Thiago Cantarin Moretti Pacheco

“Valor da Vida” (Worth, 2020) não se passa em tribunais – na verdade, o filme retrata o enorme esforço empreendido por advogados, familiares e companheiros de vítimas do atentado terrorista de 11 de setembro para evitar uma dolorosa ida às cortes.

O advogado e professor universitário Kenneth Feinberg (interpretado magistralmente por Michael Keaton) é escolhido pelo governo americano, logo após o ataque às torres gêmeas, para administrar um fundo de compensação às vítimas do evento. A finalidade do fundo é indenizar os familiares e companheiros das pessoas falecidas no traumático acontecimento – tanto os trabalhadores que estavam no World Trade Center quanto os bombeiros e policiais que morreram tentando salvá-los. O primeiro desafio de Weinberg e sua sócia (também designada para administrar o fundo de compensação) é estabelecer um valor a ser pago para os familiares das vítimas. Qual o critério a ser observado? A família de um zelador que trabalhava no World Trade Center deveria receber o mesmo que os entes queridos de um executivo que ganhava centenas de vezes mais, e assim sustentava sozinho toda a sua família? Como compensar adequadamente cada companheiro, sendo que alguns deles não conseguiam sequer comprovar formalmente os vínculos que os uniam? Como chegar a um critério justo de reparação, diante de situações tão diversas, e expectativas das mais variadas?

Entre as vítimas, há os que não enxergam na reparação monetária algo que possa minimamente “reparar” o que quer que seja – e pessoas que verdadeiramente necessitam da soma para reerguer a própria vida. Há companheiros homossexuais cuja família do falecido se recusa terminantemente a reconhecer a existência da relação. Há líderes e liderados – e desponta no grupo das vítimas a figura de Charles Wolf (Stanley Tucci), que, desde a primeira reunião com os administradores do fundo de reparação, procura ser razoável e apaziguador, mesmo com os ânimos exaltados típicos de semelhante situação. 

Aos poucos, os critérios vão se definindo de maneira mais natural – e Wolf começa a reparar que, mesmo tendo perdido a esposa no atentado terrorista, há algo que é também doloroso na incumbência recebida por Feinberg, especialmente diante da multiplicidade de situações que se apresentam e da necessidade de se obter uma aprovação unânime, entre as vítimas, dos critérios de compensação – do contrário, o assunto só poderá ser resolvido pela via contenciosa. 

“Valor da Vida” toca em temas desconfortáveis e mostra a aparente futilidade das tentativas de se “precificar” a dor humana – no entanto, ao mesmo tempo, como certas circunstâncias, mesmo extremas, podem fazer aflorar nas pessoas a compaixão necessária para amparar o seu semelhante.

ICMS E ITCMD / REFIS PR Reabertura de prazo

Suzanne Dobignies S. Koslowski

O Estado do Paraná editou o Decreto n° 5.471 de 11 de abril de 2024, que reabriu o prazo para adesão ao Programa de Parcelamento Incentivado de Débitos – instituído originalmente pela Lei n° 20.946/2021 e regulamentado pelo Decreto n° 10.766/2022. Destacamos abaixo os principais aspectos que envolvem o Programa, considerando a reabertura do prazo e as adequações realizadas pelo Decreto n° 5.471. 

Abrangência 

O REFIS/PR alcança débitos de ICM, ICMS, ICMS-ST e ITCMD, decorrentes de fatos geradores ocorridos até 31 de julho de 2023, constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa, ainda que ajuizados, inclusive os que forem objeto de parcelamentos anteriores.

Prazo para a adesão

A partir de 17 de abril de 2024, até às 18 horas (horário oficial) do dia 26 de setembro de 2024Para débitos em discussão administrativa e judicial, é necessário observar os prazos e os procedimentos especiais, os quais serão abordados abaixo.

Débitos em discussão

O Programa se estende, inclusive, aos débitos em discussão administrativa e judicial. A adesão, nestes casos, está condicionada à desistência de eventuais ações ou embargos à execução fiscal, com renúncia ao direito sobre os quais se fundam nos autos judiciais respectivos, e à desistência de eventuais impugnações, defesas e recursos apresentados no âmbito administrativo.

No caso de débitos em discussão administrativa, o contribuinte poderá optar por pagar ou parcelar a parte do crédito tributário que reconhecer como devida, mantendo a discussão sobre o restante, desde que ainda não esteja definitivamente constituído. Para tanto, deverá protocolar um Requerimento ao Setor de Processo Administrativo (SPAF) da Inspetoria de Tributação (IGT) até 02 de setembro de 2024, no qual deverá informar ao fisco os valores do crédito tributário que pretende liquidar, a data base e o respectivo valor original.

A adesão ao parcelamento de débitos ajuizados é condicionada ao envio, pelo contribuinte, de um Requerimento à Procuradoria Geral do Estado – PGE, até às 18 horas do dia 20 de setembro de 2024, para expedição do Termo de Regularização de Parcelamento – TRP. Esse pedido deverá ser formulado observando-se o Decreto n° 10.766/2022, especialmente no que se refere à inclusão da comprovação do pagamento dos honorários advocatícios ou do acordo de parcelamento de honorários.

Forma

A adesão e a formalização ao Parcelamento Incentivado ocorrerão da seguinte maneira:
(i) Acesso ao endereço eletrônico www.fazenda.pr.gov.br, mediante a identificação autenticada do devedor, podendo ser realizada pelo titular responsável ou por seu representante legal devidamente constituído;
(ii)  Pela formalização da opção pelo contribuinte e;
(iii) Pagamento da parcela única ou da primeira parcela, conforme o caso.

Benefícios

O Programa prevê a possibilidade de pagamento em parcela única ou em até 180 (cento e oitenta) parcelas. Como benefícios, aplicam-se as seguintes reduções sobre a multa e os juros, conforme o número de parcelas escolhidas pelo contribuinte:  

NÚMERO DE PARCELAS REDUÇÕES SOBRE MULTA E JUROS
ÚNICA 80% (OITENTA POR CENTO)
ATÉ 60 (SESSENTA) 70% (SETENTA POR CENTO)
ATÉ 120 (CENTO E VINTE) 60% (SESSENTA POR CENTO)
ATÉ 180 (CENTO E OITENTA) 50% (CINQUENTA POR CENTO)

Data de recolhimento

Para o pagamento em parcela única a data de vencimento será até o dia 30 de setembro de 2024. Na modalidade parcelada, o recolhimento da primeira parcela deverá ser realizado até o último dia útil do mês da adesão, enquanto as demais deverão ser pagas até o último dia útil dos meses subsequentes.

Correção monetária 

A partir da segunda parcela, até a data de vencimento incidirão juros vincendos correspondente à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – Selic mensal, aplicados sobre os valores do principal e da multa constantes na parcela. 

Regime Especial de Acordo Direto com Precatórios

A adesão dos créditos tributários realizados em até 60 (sessenta) parcelas, podem, a critério do interessado, ser parcialmente quitados mediante Pedido de Acordo Direto com Precatórios, conforme previsto no art. 2º da Lei nº 20.946/2021. Neste caso, até 95% noventa e cinco por cento) do valor total pode ser alocado para a última parcela, enquanto o restante dividido em até 59 (cinquenta e nove) parcelas mensais e sucessivas, a serem pagas em moeda corrente.

Prolik Advogados coloca-se à disposição de seus clientes para maiores esclarecimentos, caso a caso, sobre o novo REFIS/PR.

Após partilha, herdeiro é obrigado a pagar taxas de condomínio atrasadas do imóvel herdado.

Cassiano Antunes Tavares

No semestre passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão das instâncias anteriores no sentido de que os herdeiros que receberam imóvel por ocasião da partilha respondem solidariamente pelas dívidas de taxa condominial anteriores. 

No caso, o STJ houve por bem afastar a incidência do disposto no artigo 1.792, do Código Civil, pelo qual, “o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança”. Ou seja, dívidas deixadas pelo falecido somente serão suportadas pelo herdeiro até o limite do que este tenha recebido por herança.

Todavia, no caso, o entendimento se deu sob outro viés jurídico. Aplicou-se ao caso o regramento das chamadas obrigações propter rem, às quais decorrem da mera titularidade de um bem, como, no caso de imóveis, ocorre com o IPTU e as taxas condominiais, pois o dever de pagar estes valores, independentemente da época em que surgiram as dívidas respectivas, cabe ao proprietário, tão somente pela titularidade sobre o bem.

Assim, uma vez que os herdeiros permaneceram conjuntamente proprietários do imóvel herdado, foram declarados responsáveis solidariamente pelas taxas de condomínio atrasadas, em decorrência tão somente da titularidade sobre o bem, que passaram a ostentar, independentemente da expedição de formal de partilha, segundo os termos da decisão.

O advogado, Cassiano Antunes Tavares, destaca que a decisão ressalvou o direito de regresso daquele condômino que venha a pagar individualmente a dívida toda em ressarcir-se perante os demais coproprietários, na proporção de suas frações. 

Diversidade na Composição dos Órgãos da Administração e o Novo Regulamento da B3

Isadora Boroni Valério Simonetti

Em vigor desde agosto de 2023, o novo Regulamento de Emissores da B3, aplicável a companhias listadas em bolsa, estabeleceu novas diretrizes de diversidade na administração de empresas, as quais buscam promover maior representatividade de gênero e demais minorias nos Conselhos de Administração. Além de incluir as mulheres, a mudança no regulamento tem como principal objetivo o de incentivar, também, a inclusão de membros de comunidade sub-representada (quaisquer pessoas pretas, pardas ou indígenas, segundo classificação do IBGE, integrantes da comunidade LGBTQIA+, ou portadores de deficiência) em cargos de liderança.

O fomento à diversidade nos órgãos de administração e o debate sobre o tema não são recentes. Ainda assim, embora pesquisas apontem que empresas com mais diversidade têm melhores resultados e, consequentemente, maior longevidade, a ocupação de cadeiras em conselhos de administração por mulheres e representantes das minorias é pequena. Em 2023, na terceira edição da pesquisa Análise da participação das mulheres em conselhos e diretorias das empresas de capital aberto, realizada pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o levantamento apontou que apenas 15,2% dos 6.160 profissionais que compuseram a amostra nos conselhos de administração, fiscais e nas diretorias das companhias de capital aberto eram mulheres.

Se comparada às edições anteriores do levantamento realizado pelo IBGC, a diversidade vem avançando a passos lentos nos órgãos de administração de companhias de capital aberto. Em 2021, eram 12,8% de mulheres presentes, e em 2022, 14,3%. A disparidade, entretanto, deve ser enfrentada de forma prioritária, visando a uma governança mais equitativa e abrangente, e a implementação dos requisitos mínimos definidos pela B3 alimenta a expectativa de que haja uma transformação significativa no panorama corporativo, reduzindo a sub-representação e ampliando a visão estratégica das organizações.

Outro dado relevante extraído do estudo organizado pelo IBGC é o de que o baixo percentual de mulheres em posições de liderança não é exclusivo de um determinado setor e independe do tipo de controle acionário ou do segmento de negócios.

O que mais é preciso para sensibilizar as organizações a entender que a diversidade gera valor? Em artigo publicado na edição de 17 de novembro de 2023 na Harvard Business Review, as professoras Margarethe Wiersema, da Universidade da California, e Louise Mors, da Copenhagen Business School, mostraram como a presença feminina tem um impacto relevante nos conselhos.

Além de chegarem às reuniões altamente preparadas, as conselheiras são mais abertas a reconhecer quando não sabem algo, fazem perguntas relevantes e procuram trazer discussões mais profundas à mesa. Um dos entrevistados pelas professoras Margarethe e Louise comentou que “a atmosfera é diferente quando há mulheres na sala. Isso abre espaço para a discussão de tópicos que talvez não fossem considerados”. O enriquecimento dos debates e a tomada de decisões com diferentes perspectivas e experiências confirmam a conclusão obtida no estudo: a presença das mulheres parece reduzir o problema da “ignorância plural”, quando indivíduos em um grupo subestimam até que ponto os outros podem partilhar as suas preocupações.

A discrepância na representatividade entre homens e mulheres nos cargos de liderança não se resume ao número de integrantes nos órgãos de administração, mas também é vista na diferença de remuneração entre os gêneros. Mulheres que ocupam cargos de alto escalão muitas vezes enfrentam disparidades salariais em relação aos homens que desempenham funções equivalentes. Essa disparidade salarial reflete não apenas uma questão de justiça social, mas também impacta diretamente a motivação, a produtividade e o engajamento das profissionais, dificultando ainda mais a ascensão delas a posições de liderança.

Em estudo realizado pela ONU Mulheres com apoio da EY, identificou-se que o PIB global poderia ser acrescido em 35% se as diferenças salariais entre homens e mulheres fossem eliminadas.

As principais dificuldades enfrentadas por mulheres para ocupar cargos de liderança vão além da disparidade salarial e da sub-representação em Conselhos de Administração. Questões culturais, estereótipos de gênero, falta de mentoria e networking, desafios relacionados à conciliação entre vida profissional e pessoal, bem como a existência de barreiras invisíveis que dificultam a progressão na carreira, são obstáculos frequentemente enfrentados por mulheres no ambiente corporativo. A implementação de políticas e práticas inclusivas, bem como o estabelecimento de metas claras de diversidade, são passos fundamentais para superar as barreiras e promover uma maior equidade de gênero nas empresas.

Os resultados do Censo Demográfico 2022, divulgado pelo IBGE, demonstram que o Brasil tem 6 milhões de mulheres a mais do que homens. A população brasileira é composta por cerca de 104,5 milhões de mulheres e 98,5 milhões de homens, o que corresponde, respectivamente a 51,5% e 48,5% da população residente no país.

Não é difícil entender, mais uma vez, a necessidade de se ter mulheres ocupando posições que tradicionalmente são preenchidas por homens. Enquanto o Parlamento Europeu determinou, em junho de 2022, que empresas de capital aberto com sede no bloco econômico tenham, até julho de 2026, pelo menos 33% de participação de mulheres em Conselhos com funções executivas e 40% em Conselhos sem função executiva, o novo regramento da B3 traz exigências de diversidade que se referem à administração como um todo (conselho de administração e/ou diretoria estatutária).

Ademais, dois são os critérios a serem exigidos pela B3 para composição dos órgãos de administração: ao menos uma mulher e um membro de comunidade sub-representada. A exigência será aplicada em duas etapas: até 2025 é necessário que as companhias cumpram pelo menos um dos critérios e, a partir de 2026, ambos devem ser cumpridos.

Isso significa dizer, portanto, que até o fim desta temporada de assembleias ordinárias, boa parte das empresas listadas em bolsa deverá eleger os membros dos órgãos de administração cujo mandato se estenderá para além de 2025 com atenção aos requisitos da nova regulamentação.

Vale dizer, por fim, que embora o novo Regulamento da B3 se aplique às companhias listadas em bolsa, a inclusão de mais mulheres e representantes de minorias nos Conselhos de Administração de todas as empresas, a redução das discrepâncias salariais e a superação das dificuldades enfrentadas por membros destes grupos para alcançar cargos de liderança são passos fundamentais rumo a um ambiente de trabalho mais inclusivo, justo e inovador.

Revogação dos Benefícios do PERSE: Impactos imediatos e perspectivas futuras.

Fernanda Gomes Augusto

O dia 1º de abril de 2024 marca um ponto de virada para o setor de eventos no Brasil, com a entrada em vigor da Medida Provisória 1202/2023, que revoga os benefícios anteriormente concedidos pelo Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE).
 
O PERSE foi criado em resposta aos impactos econômicos da pandemia de COVID-19, oferecendo apoio financeiro para empresas do setor. No entanto, a revogação desses benefícios coloca em risco a estabilidade financeira dessas empresas, podendo levar a demissões em massa e fechamentos de negócios.
 
Em meio a esse cenário, surge o Projeto de Lei 1026/2024, que propõe estabelecer alíquotas reduzidas para o PERSE, relativamente à 12 setores, além de outras alterações, visando manter o suporte ao setor de eventos. Essa iniciativa é crucial para garantir a continuidade das operações e estimular a recuperação econômica do setor.
 
De todo modo, enquanto o projeto não é aprovado pelo Poder Legislativo, as empresas que até então eram beneficiadas pelo Programa devem retomar o recolhimento integral da CSLL, do PIS e da COFINS, sendo que o IRPJ poderá ser exigido apenas a partir de 2025, em razão do Princípio da Anterioridade.
 
A equipe do Prolik Advogados está à disposição para orientá-los, inclusive com a propositura de eventuais medidas judiciais necessárias.

É hora da Prestação de Contas Anual aos Sócios e Acionistas pelos Administradores

Flávia Lubieska Kischelewski

Os administradores de sociedades anônimas (S/As), limitadas empresariais e de sociedades simples devem, anualmente, prestar contas de sua gestão aos acionistas ou sócios, conforme o caso. Isso é efetuado por meio de Assembleia Geral Ordinária (AGO), reunião ou assembleia de sócios.

Por isso, elaboramos um guia abrangendo os principais aspectos sobre as prestações de contas, a realização de reuniões anuais de sócios de AGO e os procedimentos a serem seguidos nos principais tipos de sociedades brasileiras. 

Esse guia não se aplica a associações, fundações e cooperativas, que têm características específicas, embora seus dirigentes também devam prestar contas anualmente.

A prestação de contas anual é obrigatória?

Sim. Essa obrigação está prevista no art. 132, da Lei nº 6.404/1976, para as S/As, no artigo 1.020 do Código Civil para as sociedades simples (interpretação extensiva) e no artigo 1.078, também do Código Civil, para as limitadas empresariais.

Quando devem ocorrer as prestações de contas?

Para as S/As e limitadas, a legislação prevê que as assembleias ou reuniões devem ocorrer nos 4 primeiros meses seguintes ao término do exercício social (regra geral para boa parte das sociedades, até o final de abril de cada ano). Já para as sociedades simples, não há uma previsão de data e prazo, porém, é recomendável que se adote um calendário semelhante aos das demais sociedades, de modo a cumprir com essa obrigação societária em prazo razoável após o término do exercício e ainda no primeiro semestre do ano subsequente.

Que documentos devem ser entregues aos sócios ou acionistas?

Com pequenas variações na legislação, os administradores devem submeter para apreciação o balanço patrimonial e de resultado econômico (além de inventário para as sociedades simples). No caso das S/As, é preciso se ter demonstrações financeiras completas, além de relatório da administração e, se houver, parecer do Conselho Fiscal e dos auditores independentes.

É preciso publicar balanços e demonstrações financeiras?

A obrigatoriedade de publicação de balanços e demonstrações financeiras decorre principalmente do tipo societário, sendo obrigatório para as sociedades anônimas.

É obrigatório, nas S/As, publicar os anúncios aos acionistas da disponibilidade das demonstrações financeiras e demais documentos a serem deliberados na AGO?

Não. A publicação dos anúncios é dispensada quando todos os documentos necessários forem publicados até 1 (um) mês antes da data marcada para a realização da AGO.

Posso fazer qualquer publicação na Central de Balanços do SPED?

Não. A Central de Balanços é destinada para publicações previstas na Lei 6.404/1976, relativamente oriundas das companhias fechadas, com receita bruta anual de até R$ 78.000.000,00.

Assim, sociedades limitadas não devem usar esse serviço, devendo os administradores, até 30 dias antes da data marcada para a assembleia ou reunião de sócios, fornecer ou colocar à disposição dos sócios que não exerçam a administração o balanço patrimonial e o de resultado econômico.

Preciso convocar previamente os sócios ou acionistas para as reuniões anuais ou AGOs?

Os conclaves serão regulares sempre que contarem com a totalidade dos sócios ou acionistas da empresa. Se isso ocorrer, de acordo com a Lei 6.404/1976, será inclusive considerada sanada a falta de publicação dos anúncios ou a inobservância dos prazos de publicação aplicáveis à realização a AGO.

Não se podendo assegurar a presença de 100% dos sócios ou acionistas, a convocação deve ser efetuada. Para as S/As fechadas, com 8 dias de antecedência, no mínimo, à AGO. Vale dizer que, pela Instrução Normativa DREI/ME nº 88/2022, a convocação é única quando realizada na Central de Balanços do SPED.

Para as limitadas, deve-se observar as regras de convocação previstas no contrato social, sendo que o anúncio de convocação da assembleia ou reunião de sócios deve ser publicado por três vezes, ao menos, entre a data da primeira inserção e a da realização desse evento.

Há quórum mínimo de instalação para as AGOs ou reuniões de sócios?

Sim. Em se tratando de limitadas, a reunião ou assembleia dos sócios se instala com a presença, em primeira convocação, de titulares de no mínimo ¾ do capital social, e, em segunda, com qualquer número. Já para as S/As, assembleia geral será instalada, em primeira convocação, com a presença de acionistas que representem, no mínimo, ¼ dos acionistas votantes e, em segunda convocação, instalar-se-á com qualquer número.

As presenças de acionistas devem ser registradas no livro societário específico da companhia, conforme determina a lei.

As reuniões ou AGOs podem ser digitais?

Sim, as reuniões ou assembleias podem ser presenciais, digitais ou semidigitais.

Juntamente com as prestações de contas, é possível deliberar sobre outros temas?

Sim, além da aprovação de contas e da deliberação sobre os resultados e pagamento de dividendos ou lucros, é possível realizar a eleição de administradores. A votação de outros temas pode ocorrer se tiver sido prevista na convocação, sendo considerados tópicos de reunião ou assembleia extraordinária que pode ocorrer cumulativamente.

Devo fazer ata de reunião ou da AGO? Essas atas precisam ser arquivadas na Junta Comercial?

Sim, isso é fundamental, devendo ser registrados também as declarações de voto ou dissidências, bem como protestos apresentados.

Para as sociedades de caráter empresarial, as atas, além de transcritas ou insertas nos respectivos Livros de Atas de Assembleias da sociedade, devem ser arquivadas perante a Junta Comercial. No caso das sociedades limitadas, o prazo para arquivamento é de 20 dias subsequentes à reunião ou assembleia, enquanto, nas S/As, o prazo é de 30 dias.

O registro em ata da aprovação de contas dos administradores os isenta de responsabilidades futuras pelos atos de gestão realizados no período examinado. É uma forma de quitação que não se pode ignorar e o arquivamento torna isso público e oponível a terceiros.

Todos esses passos são obrigatórios para as sociedades simples?

Não. Como dito acima, a realização da prestação de contas anual pela administração decorre de uma interpretação extensiva da legislação aqui realizada por ser uma boa prática de governança corporativa.

O artigo 1.020 do Código Civil estabelece o que segue: “os administradores são obrigados a prestar aos sócios contas justificadas de sua administração, e apresentar-lhes o inventário anualmente, bem como o balanço patrimonial e o de resultado econômico.” Como se lê, não está dito que a reunião é anual, mas que a entrega de inventario aos sócios é anual. Apesar disso, não faria sentido apresentar anualmente somente o inventário e deixar de prestar contas por completo da gestão realizada, de onde se deduz que houve falha na redação desse artigo.

Essa prestação de contas deve ser feita a todos os sócios e não apenas individualmente, podendo ocorrer por meio de entrega das efetivas informações, com prova de recebimento. Isso porque, para essas sociedades, a lei não exige maiores formalidades. Da mesma forma, a legislação não prevê a necessidade formal da aprovação das contas pelos sócios, o que pode ser implícito, isto é, quando os sócios tomam ciência das contas e a elas não se opõem.

Tampouco há obrigação legal de lavratura de atas de reunião ou arquivamento dessas no cartório competente. Mesmo assim, cada sociedade deve ponderar sobre a conveniência e a prática da realização de reuniões e registro das deliberações em ata. Em muitos, essa medida pode ser efetiva ao compilar as decisões que forem tomadas em determinado momento, prevenindo conflitos posteriores, além de ser útil, no caso de distribuição de dividendos, para repasse aos contadores responsáveis, o que embasará o cumprimento de obrigações tributárias por sócios e sociedades.