
Flávia Lubieska N. Kischelewski
Em fevereiro de 2025, o Ministro Raul Araújo, da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Relator do REsp 2.053.655, proferiu voto para acolher uma mudança na forma de distribuição de dividendos de uma empresa prestadora de serviços de gestão empresarial e consultoria.
A discussão apresentada à Corte questionava se era válida a estipulação contratual social de uma sociedade empresária limitada, prestadora de serviços de gestão empresarial, na qual havia sido estabelecido em assembleia de sócios, forma de distribuição de dividendos (participação nos lucros) proporcional aos dias trabalhados por cada sócio (e não de acordo com a participação de cada um no capital social, isto é, com base no número de cotas).
A sócia minoritária sentia-se prejudicada pela alteração superveniente e não consensual dos critérios de distribuição de resultados, em razão de não poder comparecer o período mínimo estipulado na sociedade para trabalhar, o que diminuiria o valor que havia sido originalmente acordado para sua participação. Por ocasião da mudança, cada sócio passaria a receber de acordo com os serviços prestados, mas, no entender dessa sócia, essa alteração seria nula, pois ela estaria sendo excluída da participação dos lucros da sociedade e das perdas, o que é vedado pelo art. 1.008, do Código Civil.
Pela decisão mencionada, “é ampla a liberdade dos sócios em convencionar contratualmente outro modo de distribuição dos resultados, desde que não haja o exercício abusivo do direito, isto é, não se configure pacto leonino que atribua vantagens ou desvantagens excessivas a algum sócio, como a abdicação dos lucros”.
A advogada Flávia Lubieska N. Kischelewski esclarece que, neste caso, o julgado considerou que: (i) o contrato social previa a distribuição desproporcional de lucros; (ii) houve uma decisão dos sócios, ainda que por maioria, definindo os novos critérios de distribuição de lucros (isso foi deliberado em assembleia de sócios, embora, o mais comum seja firmar um Acordo de Sócios); (iii) não houve exclusão da sócia minoritária da participação nos lucros, nem nas perdas da sociedade; (iv) o objeto social era a prestação de serviços, de modo que se entendeu que todos os sócios deveriam contribuir com seu labor para a sociedade e para o sucesso empresarial.
Todas essas peculiaridades precisam ser observadas, antecipadamente, pelos sócios para prevenir desentendimentos futuros. Além disso, é possível que o critério de “dias trabalhados” possa não ser o mais adequado caso o objeto social da sociedade empresária seja outro, por exemplo. Também se deve considerar há valores que são pagos aos sócios administradores diretamente em razão da prestação de serviços pela gestão da sociedade, isto é, o pró-labore, e que não se confunde com a distribuição de lucros. É por questões como as aqui citadas que a assistência de um advogado especializado pode fazer a diferença na constituição e na preservação de uma sociedade.