Por Ingrid Karol Cordeiro Moura

Em recente publicação, a Secretaria da Receita Federal do Brasil, por meio da Solução de Consulta nº 99.101, ao ser questionada pelo contribuinte sobre a inclusão do terço constitucional de férias e da importância paga pelo empregador nos 15 primeiros dias que antecedem o auxílio-doença, entendeu que, em razão da novel Nota PGFN/CRJ/Nº 520/2017 de 8 de junho de 2017, não estaria vinculada a afastar tais verbas da base de cálculo da contribuição previdenciária.
Rememorando a questão, sobre o terço constitucional de férias, 15 primeiros dias do auxílio-doença e o aviso prévio indenizado, o STF declarou, por meio da análise do Tema 908 (RE 892.238), que inexiste repercussão geral para o tema.
Assim, as matérias foram devidamente analisadas pelo STJ, quando do julgamento do REsp nº 1.230.957 no âmbito dos recursos repetitivos, e, neste Tribunal, o ministro afastou a inclusão das verbas relativas ao terço constitucional de férias, pagamento dos 15 primeiros dias do auxílio-doença e, igualmente, o aviso-prévio indenizado, da base de cálculo da contribuição previdenciária pagas pelo empregador. Vitória, portanto, dos contribuintes quanto a estas três rubricas.
Não obstante isso, a PGFN consciente de sua derrota no judiciário, por meio da Nota PGFN/CRJ/Nº 115/2017, orientou os procuradores da fazenda nacional a não recorrerem das matérias versadas naquele recurso especial e, também, orientou a não contestarem, posto que, em observância aos ditames do novel códex processual civil, curvava-se à decisão do STJ, já que a questão foi definida no âmbito dos recursos repetitivos.
Posteriormente, questionada pela SRFB sobre o alcance da Nota PGFN/CRJ/Nº 115/2017, a PGFN emitiu nova nota explicativa, qual seja a Nota PGFN/CRJ/Nº 520/2017, aduzindo que a SRFB não estaria vinculada àquela primeira nota. Ou seja, embora sua orientação inicial aos procuradores da fazenda nacional que atuam em juízo seja para que não mais ofereçam recursos ou contestação sobre os 3 temas discutidos, a SRFB poderia adotar comportamento diferente, já que não estaria vinculada.
Desta forma, a SRFB em resposta a questionamento do contribuinte, então, por meio da Solução de Consulta citada, manifestou o entendimento de que vai continuar considerando e cobrando tais rubricas na base de cálculo da contribuição previdenciária, já que a Nota PGFN /CRJ/Nº 520/2017 não a vincula.
Pois bem. A problemática aqui enfrentada é: não há paridade de entendimento entre os órgãos fazendários. Ou seja, a PGFN orienta seus procuradores a curvarem-se perante a decisão do STJ, que, frisa-se, afastou o terço constitucional, os 15 primeiros dias do auxílio-doença e o aviso prévio indenizado da base de cálculo da contribuição previdenciária, em decisão proferida em recurso repetitivo.
Por outro lado, a SRFB diz que vai continuar cobrando do contribuinte, já que as notas explicativas emitidas pela PGFN não a vinculam.
Ora, diante de tais posicionamentos divergentes de dois órgãos que realizam a arrecadação de tributos no âmbito nacional (SRFB e PGFN), o contribuinte fica à mercê destas autoridades fiscais, já que vê a discussão travada no judiciário não alcançar a aplicabilidade prática a que era esperada, mesmo diante da ilegalidade já reconhecida pelo STJ.
Traçando um paralelo também com as novas diretrizes trazidas pelo novo Código de Processo Civil, que visa a equilibrar as relações entre as partes envolvidas, para fins de salvaguardar a segurança jurídica e assim garantir a aplicação isonômica da jurisprudência e da legislação no país, quando o contribuinte se depara com uma situação em que há dissonância de tratamento entre órgãos administrativos que atuam no âmbito da arrecadação de tributos, passa-se a questionar a qualidade e a própria eficácia da produção dos efeitos das decisões judiciais proferidas neste tipo de processo.
Isso porque, acaso permitida tal situação, a segurança jurídica, como pilar do Estado Democrático de Direito e como princípio norteador do sistema legal brasileiro, inclusive o processual, é totalmente afastada em detrimento da arrecadação fiscal, o que não se poderia admitir.
Os contribuintes não desconhecem que a autoridade administrativa tem poder vinculado e age por meio de atos discricionários, no entanto, não poderia haver tamanha dissociação de conceitos e princípios, posto que ambas as partes, seja em maior ou menor grau, são prejudicadas, já que o reflete na sociedade como um todo.
Como dito, o STJ já declarou que as verbas citadas anteriormente não devem fazer parte da base de cálculo das contribuições previdenciárias. Ou seja, já declarou a ilegalidade destas inclusões.
A SRFB, pelo questionamento feito a PGFN, tinha dúvidas quanto à aplicação da nota explicativa. Dúvidas estas que não deveriam existir, já que há legislação que assegura o comportamento da não recorribilidade (Art. 19 da Lei 10.522/2002). A nota, como o próprio nome diz, é meramente explicativa para justificar o comportamento a ser adotado pelas autoridades fiscais.
Assim, partindo do órgão arrecadador as normativas necessárias para a aplicação prática da não exigência das rubricas inseridas na contribuição previdenciária, estariam adotando uma postura ativa e equânime, que lhes é esperada.
Resta aos contribuintes, no atual cenário desenhado, apenas aguardar que a SRFB e a PGFN adotem um critério único e cheguem a um denominador comum a fim de que os direitos e as garantias fundamentais expressas na CF/88 sejam respeitados.
Assim como, respeitados também os preceitos em que erigidos o Novo Código de Processo Civil, a fim de dar o devido acatamento e atendimento as questões debatidas e firmadas nos Tribunais Superiores, a exemplo do caso citado e analisado neste artigo. Para que desta forma, reste, por fim equilibrada a relação tríplice entre contribuinte, fisco e judiciário.
Há muito ainda que se discutir e evoluir sobre a postura adotada tanto pela SRFB quanto pela PGFN, bem como quanto às decisões perpetradas pelo Poder Judiciário, para que se mantenha a paridade e o equilíbrio entre as relações do fisco com os contribuintes. Por enquanto, resta aguardar que o bom senso e a ética direcionem os atos a serem tomados.