Diversidade na Composição dos Órgãos da Administração e o Novo Regulamento da B3

Isadora Boroni Valério Simonetti

Em vigor desde agosto de 2023, o novo Regulamento de Emissores da B3, aplicável a companhias listadas em bolsa, estabeleceu novas diretrizes de diversidade na administração de empresas, as quais buscam promover maior representatividade de gênero e demais minorias nos Conselhos de Administração. Além de incluir as mulheres, a mudança no regulamento tem como principal objetivo o de incentivar, também, a inclusão de membros de comunidade sub-representada (quaisquer pessoas pretas, pardas ou indígenas, segundo classificação do IBGE, integrantes da comunidade LGBTQIA+, ou portadores de deficiência) em cargos de liderança.

O fomento à diversidade nos órgãos de administração e o debate sobre o tema não são recentes. Ainda assim, embora pesquisas apontem que empresas com mais diversidade têm melhores resultados e, consequentemente, maior longevidade, a ocupação de cadeiras em conselhos de administração por mulheres e representantes das minorias é pequena. Em 2023, na terceira edição da pesquisa Análise da participação das mulheres em conselhos e diretorias das empresas de capital aberto, realizada pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o levantamento apontou que apenas 15,2% dos 6.160 profissionais que compuseram a amostra nos conselhos de administração, fiscais e nas diretorias das companhias de capital aberto eram mulheres.

Se comparada às edições anteriores do levantamento realizado pelo IBGC, a diversidade vem avançando a passos lentos nos órgãos de administração de companhias de capital aberto. Em 2021, eram 12,8% de mulheres presentes, e em 2022, 14,3%. A disparidade, entretanto, deve ser enfrentada de forma prioritária, visando a uma governança mais equitativa e abrangente, e a implementação dos requisitos mínimos definidos pela B3 alimenta a expectativa de que haja uma transformação significativa no panorama corporativo, reduzindo a sub-representação e ampliando a visão estratégica das organizações.

Outro dado relevante extraído do estudo organizado pelo IBGC é o de que o baixo percentual de mulheres em posições de liderança não é exclusivo de um determinado setor e independe do tipo de controle acionário ou do segmento de negócios.

O que mais é preciso para sensibilizar as organizações a entender que a diversidade gera valor? Em artigo publicado na edição de 17 de novembro de 2023 na Harvard Business Review, as professoras Margarethe Wiersema, da Universidade da California, e Louise Mors, da Copenhagen Business School, mostraram como a presença feminina tem um impacto relevante nos conselhos.

Além de chegarem às reuniões altamente preparadas, as conselheiras são mais abertas a reconhecer quando não sabem algo, fazem perguntas relevantes e procuram trazer discussões mais profundas à mesa. Um dos entrevistados pelas professoras Margarethe e Louise comentou que “a atmosfera é diferente quando há mulheres na sala. Isso abre espaço para a discussão de tópicos que talvez não fossem considerados”. O enriquecimento dos debates e a tomada de decisões com diferentes perspectivas e experiências confirmam a conclusão obtida no estudo: a presença das mulheres parece reduzir o problema da “ignorância plural”, quando indivíduos em um grupo subestimam até que ponto os outros podem partilhar as suas preocupações.

A discrepância na representatividade entre homens e mulheres nos cargos de liderança não se resume ao número de integrantes nos órgãos de administração, mas também é vista na diferença de remuneração entre os gêneros. Mulheres que ocupam cargos de alto escalão muitas vezes enfrentam disparidades salariais em relação aos homens que desempenham funções equivalentes. Essa disparidade salarial reflete não apenas uma questão de justiça social, mas também impacta diretamente a motivação, a produtividade e o engajamento das profissionais, dificultando ainda mais a ascensão delas a posições de liderança.

Em estudo realizado pela ONU Mulheres com apoio da EY, identificou-se que o PIB global poderia ser acrescido em 35% se as diferenças salariais entre homens e mulheres fossem eliminadas.

As principais dificuldades enfrentadas por mulheres para ocupar cargos de liderança vão além da disparidade salarial e da sub-representação em Conselhos de Administração. Questões culturais, estereótipos de gênero, falta de mentoria e networking, desafios relacionados à conciliação entre vida profissional e pessoal, bem como a existência de barreiras invisíveis que dificultam a progressão na carreira, são obstáculos frequentemente enfrentados por mulheres no ambiente corporativo. A implementação de políticas e práticas inclusivas, bem como o estabelecimento de metas claras de diversidade, são passos fundamentais para superar as barreiras e promover uma maior equidade de gênero nas empresas.

Os resultados do Censo Demográfico 2022, divulgado pelo IBGE, demonstram que o Brasil tem 6 milhões de mulheres a mais do que homens. A população brasileira é composta por cerca de 104,5 milhões de mulheres e 98,5 milhões de homens, o que corresponde, respectivamente a 51,5% e 48,5% da população residente no país.

Não é difícil entender, mais uma vez, a necessidade de se ter mulheres ocupando posições que tradicionalmente são preenchidas por homens. Enquanto o Parlamento Europeu determinou, em junho de 2022, que empresas de capital aberto com sede no bloco econômico tenham, até julho de 2026, pelo menos 33% de participação de mulheres em Conselhos com funções executivas e 40% em Conselhos sem função executiva, o novo regramento da B3 traz exigências de diversidade que se referem à administração como um todo (conselho de administração e/ou diretoria estatutária).

Ademais, dois são os critérios a serem exigidos pela B3 para composição dos órgãos de administração: ao menos uma mulher e um membro de comunidade sub-representada. A exigência será aplicada em duas etapas: até 2025 é necessário que as companhias cumpram pelo menos um dos critérios e, a partir de 2026, ambos devem ser cumpridos.

Isso significa dizer, portanto, que até o fim desta temporada de assembleias ordinárias, boa parte das empresas listadas em bolsa deverá eleger os membros dos órgãos de administração cujo mandato se estenderá para além de 2025 com atenção aos requisitos da nova regulamentação.

Vale dizer, por fim, que embora o novo Regulamento da B3 se aplique às companhias listadas em bolsa, a inclusão de mais mulheres e representantes de minorias nos Conselhos de Administração de todas as empresas, a redução das discrepâncias salariais e a superação das dificuldades enfrentadas por membros destes grupos para alcançar cargos de liderança são passos fundamentais rumo a um ambiente de trabalho mais inclusivo, justo e inovador.

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