Reequilíbrio econômico-financeiro de contratos administrativos em razão da Reforma Tributária.

Eduardo Mendes Zwierzikowski

A promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023, que teve por objetivo substituir os impostos sobre o consumo por um modelo de IVA (Imposto sobre Valor Agregado) dual, integrado pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), representa um marco na reestruturação do sistema tributário brasileiro. As profundas alterações introduzidas por essa reforma produzem reflexos relevantes no regime jurídico dos contratos em geral, e especialmente os contratos administrativos. 

Para mitigar os impactos das novas exações, a Lei Complementar nº 214/2025 dedicou um capítulo à disciplina do reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos públicos, reforçando a importância da segurança jurídica e da estabilidade nas relações contratuais com a administração pública.

A nova legislação estabelece, de forma cogente, a obrigação da administração pública, em todos os níveis federativos, de revisar contratos firmados antes da vigência da reforma, sempre que comprovado o desequilíbrio econômico-financeiro decorrente da instituição dos novos tributos. 

Contratos Administrativos abrangidos

Essa previsão visa preservar  o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, assegurando à contratada a manutenção das condições originais da proposta apresentada na licitação, sendo aplicável aos contratos celebrados pela administração pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive concessões públicas.

O artigo 373, da LC 214/2025, delimita o escopo de aplicação dos instrumentos de ajuste para o reequilíbrio dos contratos administrativos, estabelecendo que eles são aplicáveis apenas aos contratos firmados anteriormente  à entrada em vigor da lei (16 de janeiro de 2025) e, excepcionalmente, a aqueles que, mesmo firmados após à referida data, contem com proposta apresentada antes da sua entrada em vigor  (§ 1º). 

Parâmetros de Reequilíbrio

Já o artigo 374 define os parâmetros para aferição da “carga tributária efetiva” para fins de reequilíbrio, que deve abranger: (i) os efeitos da não cumulatividade nas aquisições e custos incorridos pela contratada e o direito a créditos de IBS/CBS; (ii) a possibilidade de repasses a terceiros, pela contratada, do encargo financeiro oriundo da instituição do IBS e da CBS; (iii) o impacto das alterações durante os períodos de transição da reforma tributária; e (iv) a perda de benefícios ou incentivos fiscais relacionados a tributos extintos. 

De modo inovador, o § 2º , do art. 374, afasta a aplicação de cláusulas contratuais que atribuam à contratada o ônus integral de tributos supervenientes, reconhecendo a excepcionalidade do cenário tributário inaugurado.

Procedimento

Os artigos 375 e 376, por sua vez, tratam do procedimento de revisão. O primeiro prevê a possibilidade de reequilíbrio de ofício quando verificada redução da carga tributária; o segundo permite o pleito pela contratada, que deve instruí-lo com elementos que comprovem o efetivo desequilíbrio. O pedido deverá tramitar de forma prioritária e o prazo para decisão definitiva é de 90 dias, prorrogável uma única vez, sendo possível, em casos de impacto relevante, o reequilíbrio cautelar (§ 4º), especialmente nas concessões de serviços públicos.

Meios para se obter o Reequilíbrio contratual

Com relação aos meios para se alcançar o reequilíbrio contratual, a LC 214/2025 prevê que ele poderá ocorrer por meio de: 1) revisão dos valores contratados; 2) compensações financeiras, ajustes tarifários ou outros valores contratualmente devidos à contratada, inclusive a título de aporte de recursos ou contraprestação pecuniária; 3) renegociação de prazos e condições de entrega ou fornecimento de serviços; 4) elevação ou redução de valores devidos à administração pública, inclusive direitos de outorga; 5) transferência a uma das partes de custos ou encargos originalmente atribuídos à outra; ou 6) outros métodos considerados aceitáveis pelas partes, observada a legislação do setor ou de regência do contrato. 

Inaplicabilidade da LC 2014/2025 aos contratos privados

Embora a LC 214/2025 exclua formalmente os contratos privados de seu regime, a magnitude da reforma reacende o debate sobre a possibilidade de aplicação de institutos tradicionais do direito privado, como a teoria da imprevisão e a onerosidade excessiva (arts. 317 e 478 do Código Civil), diante dos impactos ainda incertos da reforma tributária, que podem fundamentar pedidos de revisão contratual, desde que demonstrado o efetivo desequilíbrio e a ocorrência de um fato superveniente, imprevisível e extraordinário capaz de alterar a base objetiva do contrato.

Assim, os artigos 373 à 377 da Lei Complementar nº 214/2025 inauguram um microssistema jurídico destinado a neutralizar os efeitos da reforma tributária sobre os contratos administrativos, fortalecendo a estabilidade e a previsibilidade nas contratações públicas. Ainda que o novo regime busque simplificar o sistema, ele impõe desafios técnicos e metodológicos à gestão contratual, exigindo dos operadores do direito uma atuação proativa na análise e recomposição do equilíbrio econômico-financeiro.

CBS e IBS na base de cálculo do ICMS, ISS e IPI? A primeira grande polêmica da reforma tributária.

Heloisa Guarita Souza

A reforma tributária nem bem foi implementada, com as cobranças efetivas da CBS e do IBS, e já começaram as discussões envolvendo a interpretação de suas normas, o que pode desaguar em judicialização. Tudo na contramão de seus objetivos, dentre os quais a neutralidade tributária, simplificação e a redução dos litígios.

A “bola da vez” da controvérsia está na inclusão ou não da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e na base de cálculo do ICMS, ISS e IPI.

Tudo porque a PEC 45/2019, antes de ser convertida na Emenda Constitucional 132/2023 – que deu início à reforma tributária do consumo – vedava expressamente a inclusão do IBS e da CBS nas bases de cálculo do ICMS e do ISS.  Entretanto, antes de ser convertida, a previsão foi suprimida do texto de Emenda à Constituição. Hoje, tanto a Emenda Constitucional 132/2023 quanto a Lei Complementar nº 214/2025 vedam apenas a inclusão do IBS e da CBS em suas próprias bases e nas bases do Imposto Seletivo, do PIS e da Cofins, deixando uma lacuna quanto aos outros impostos.

Esse silêncio normativo levou à proposição, no Congresso Nacional, do PLP nº 16/2025, apresentado em fevereiro deste ano e busca justamente garantir a exclusão expressa dos novos tributos nas bases de cálculo do ICMS, ISS e IPI. No entanto, ainda não há perspectiva para a sua análise e, muito menos, aprovação.

Do ponto de vista jurídico, há argumentos sólidos contra essa inclusão. A retirada da vedação que constava no texto original da PEC 45/2019 não pode ser interpretada automaticamente como uma autorização para a cobrança, sobretudo porque o novo sistema foi desenhado para eliminar a incidência em cascata. Além disso, a inclusão ofende os princípios da simplicidade, da transparência e da não cumulatividade, pilares declarados como “essenciais” à reforma tributária. A natureza jurídica dos novos tributos também vai contra a inclusão.

O IBS e a CBS são tributos indiretos, pagos pelo consumidor final e apenas repassados pelo contribuinte. Assim, não integram o faturamento ou receita bruta da empresa, o que reforça o argumento de que não devem ser incluídos na base de cálculo de outros tributos. É o que aconteceu com a chamada “tese do século”, quando o STF decidiu que o ICMS não poderia integrar a base de cálculo do PIS e da Cofins.

Em matéria publicada pelo “O Portal da Reforma Tributária” (….) , o próprio CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), entidade responsável pela formulação inicial da PEC 45, publicou uma nota técnica intitulada de “O absurdo jurídico da tese econômica que pretende incluir o IBS e a CBS na base de cálculo do ICMS e do ISS” advertindo que a manutenção dessa tributação cruzada teria como efeito um aumento indevido da carga tributária efetiva, maior custo de conformidade para empresas e incremento substancial do contencioso administrativo e judicial.

Porém, em veiculações da imprensa, tanto União, como Estados e Municípios têm sustentado que a ausência de proibição autoriza a tributação. Para eles, excluir IBS e CBS das bases do ICMS e do ISS significaria reduzir a arrecadação em plena fase de transição, rompendo com a promessa de “neutralidade” que guiou a reforma. O Comsefaz, que representa as secretarias estaduais de Fazenda, já afirmou que qualquer tentativa de limitar a base dos tributos antigos seria uma sabotagem aos princípios de equilíbrio e manutenção da carga tributária. A Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), por sua vez, divulgou projeções segundo as quais a perda de receita apenas no ISS poderia atingir 16% até 2032 se não houver a inclusão dos novos tributos em sua base. Na prática, a tendência é a inclusão dos novos tributos nas bases de cálculo dos tributos antigos.

Em síntese, a situação é de incerteza: de um lado, governos já sinalizam que irão incluir IBS e CBS na base do ICMS e do ISS durante a transição, ancorados na ausência de proibição expressa e na necessidade de preservar receitas; de outro, existem argumentos defensáveis de que a inclusão contraria os objetivos da reforma e deve ser afastada, muito provavelmente via judicialização.

Trata-se, pois, de um ponto de atenção para os próximos meses. Esperamos ter uma definição que deve nortear os procedimentos dos contribuintes, essencialmente a partir de janeiro de 2027, tendo em vista que no próximo ano de 2026 o recolhimento da CBS/IBS ainda é facultativo.

Prolik Advogados continua acompanhando o tema para a devida orientação a seus clientes.

Muito além da nova Nota Fiscal Eletrônica: a Reforma Tributária chega sem manual para o contribuinte.

Luana Maria Vaz

Com a chegada da Reforma Tributária no Brasil, toda informação é ouro. A poucos meses do início de sua implementação, muitas dúvidas pairam pelo ar e as regras do jogo ainda não são claras. 

O cronograma de implantação teve início em julho de 2025, com a liberação do ambiente de homologação para testes — ainda sem valor fiscal. A partir de outubro, será possível emitir documentos fiscais com validade jurídica já no novo modelo, de forma facultativa. No entanto, é a partir de 5 de janeiro de 2026 que o novo sistema se tornará obrigatório: todas as Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e) e Notas Fiscais de Serviço Eletrônicas (NFS-e) deverão conter os dados dos novos tributos instituídos pela Lei Complementar nº 214/2025 — o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).

Esses dados deverão ser inseridos conforme os layouts padronizados da Nota Técnica 2025.002-RTC e do Informe Técnico 2025.002 v.1.11, que definem a estrutura técnica e as regras de validação dos documentos fiscais eletrônicos. O uso do modelo antigo será permitido apenas até dezembro de 2025. A partir de janeiro, os sistemas emissores de NF-e das empresas (ERPs) precisarão estar adaptados às novas exigências, com validação automática via SEFAZ e Receita Federal.

A nova nota fiscal exigirá o preenchimento do grupo UB, que contempla os tributos IBS, CBS e IS. Nele, devem ser informados obrigatoriamente os campos do Código de Situação Tributária (CST-IBS/CBS) e o Código de Classificação Tributária (cClassTrib), cuja correta seleção será essencial para que a nota seja validada no ambiente de produção. Também será necessário informar a base de cálculo, as alíquotas do IBS (estadual e municipal) e da CBS, os valores dos tributos, devoluções, créditos presumidos e outras informações específicas.

O grupo W03 da NF-e, por sua vez, será responsável pela totalização dos valores relacionados ao IBS, CBS e IS. Como esses tributos passam a ser cobrados “por fora”, seus valores devem ser somados ao preço do produto ou serviço. Segundo o §1º do art. 348 da LC nº 214/2025, ao longo de 2026, os contribuintes que cumprirem corretamente as obrigações acessórias estarão dispensados do recolhimento efetivo dos tributos, embora continuem obrigados a destacá-los. A opção de recolher os tributos neste período, permite o acúmulo de créditos compensáveis — uma decisão estratégica que exige avaliação cuidadosa, mas que ainda carece de explicações claras por parte do fisco.

Apesar do cronograma formalmente divulgado e da disponibilização de documentos técnicos, não se é falado sobre os impactos operacionais da reforma tributária conforme o perfil de cada contribuinte. As obrigações acessórias vêm sendo minuciosamente tratadas do ponto de vista técnico, mas não foram traduzidas em termos práticos para diferentes realidades empresariais — como micro, pequenas e médias empresas.

Esse vácuo informacional cria um ambiente de insegurança jurídica e de planejamento. Enquanto grandes contribuintes estruturaram comitês internos, realizaram simulações de impacto e adaptaram seus sistemas e margens desde o Projeto Piloto (confira o conteúdo aqui), muitas pequenas e médias empresas seguem paralisadas, sem saber se poderão repassar preços, manter margens ou se precisarão renegociar com fornecedores e clientes.

A falta de clareza se intensifica quando se observa que a alíquota padrão da CBS e do IBS poderá chegar a 27%, o que impacta diretamente a precificação. Simular o efeito líquido dessa carga tributária, com base nos créditos recuperáveis, é fundamental para evitar decisões equivocadas, como permanecer no Simples Nacional ou migrar para regimes mais complexos sem viabilidade operacional.

Em especial, as empresas de médio porte — geralmente enquadradas no Lucro Presumido ou Real — estão entre as mais vulneráveis. De acordo com pesquisa da Qive em parceria com a Endeavor, 35% das médias empresas consideram a reforma um desafio crítico. Muitas ainda veem a mudança como uma simples atualização de ERP ou nota fiscal, quando, na verdade, trata-se de uma transformação econômica de base, que demanda diagnóstico técnico, mapeamento de tributos, revisão de custos e nova política comercial.

A introdução dos novos tributos ocorre sob o discurso de modernização, padronização e simplificação. Porém, essa promessa bate de frente com a realidade de uma base empresarial ainda sem ferramentas, orientação ou clareza sobre como a reforma afetará seu dia a dia — seu caixa, sua margem, seus contratos e sua competitividade.

Sem um plano de transição transparente, acessível e escalonado por porte e setor de empresa, o novo sistema se mostra formalmente estruturado, mas materialmente inseguro. Mais uma vez, o contribuinte é deixado sozinho para interpretar e aplicar corretamente um sistema complexo, mal comunicado e operacionalmente desafiador. 

Diante desse cenário, é imprescindível o entendimento personalizado sobre cada tipo de operação e modelo de negócio. A equipe de Direito Tributário do Prolik Advogados se coloca à disposição para apoiar a sua empresa nesse momento de transição, oferecendo diagnóstico, planejamento e suporte jurídico para garantir conformidade e segurança.

Receita Federal institui projeto piloto de Reforma Tributária.

Luana Maria Vaz

A Receita Federal do Brasil publicou, em 13 de junho de 2025, a Portaria RFB nº 549/2025, que instituiu o Piloto da Reforma Tributária do Consumo referente à Contribuição sobre Bens e Serviços, denominado Piloto RTC – CBS. O programa tem o intuito de possibilitar ao Governo Federal, a realização de testes, validação e aprimoramento tecnológico do novo sistema tributário, além de estimular a adaptação antecipada de contribuintes e setores econômicos às novas exigências. O projeto é conduzido em parceria com o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), no âmbito do Programa para Implementação dos Sistemas Operacionais da Reforma Tributária, previsto na Portaria RFB nº 501/2024.

O piloto teve início em 1º de julho de 2025, e será implementado em etapas progressivas. Inicialmente, um grupo de cerca de 50 empresas de diversos setores, como Petrobras, Vale, Nestlé, Gerdau e Volkswagen, participam da simulação de fluxos de processos. Entre as atividades previstas estão a emissão de documentos fiscais com destaque da CBS e do IBS, testes com a calculadora da contribuição e a verificação de dados cadastrais. Nesta fase inicial, os testes são realizados manualmente e envolvem apenas a simulação de operações, sem qualquer efeito tributário real.

As empresas participantes foram selecionadas com base em critérios como relacionamento prévio com a Receita Federal, participação em programas de conformidade (como o Confia) ou homologações no Sistema Público de Escrituração Digital (SPED). A participação é voluntária e formalizada por meio de Carta Convite enviada pela Receita via e-CAC, na qual o contribuinte pode manifestar o aceite através da assinatura de um Termo de Adesão. A seleção e validação das empresas é feita de forma escalonada, conforme a evolução técnica do sistema.

A Receita Federal divulgou que os testes começarão pelo regime geral de tributação. Vídeos de orientações já estão disponíveis no canal da Receita Federal no Youtube, além do manual do piloto e o passo a passo da apuração assistida, no site do GOV. Embora o primeiro grupo de empresas já esteja fechado, novas fases do piloto poderão contar com a entrada de novos participantes, inclusive por indicação do Comitê Gestor do IBS ou de entidades representativas. Empresas de setores específicos serão incorporadas conforme a necessidade de testes mais amplos.

Por fim, a Portaria RFB nº 549/2025 deixa muito claro que a participação no Piloto RTC – CBS não gera qualquer direito, obrigação tributária, vantagem ou expectativa de tratamento diferenciado às empresas envolvidas, sendo uma ação voltada exclusivamente à colaboração técnica e de caráter não vinculante para a preparação da nova sistemática de tributação sobre o consumo.

Para mais detalhes e orientações sobre o tema, a equipe do Prolik Advogados está à disposição.

Reforma Tributária: Período de Transição em 2026 não exigirá cobrança de IBS e CBS.

João Fernando Bassil Miranda e Luana Maria Vaz

A reforma tributária no Brasil iniciará de forma gradual a partir de 2026. Os principais pilares dessa reforma serão a instituição do Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS) que substituirão, gradualmente, os atuais impostos, como ICMS, ISS, PIS e COFINS. Além disso, entrará em vigor o Imposto Seletivo (IS), que incidirá com caráter extrafiscal para desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

Embora a transição comece em 2026, a cobrança efetiva e obrigatória do IBS e da CBS terá início somente em 2027, ano em que o PIS e a COFINS serão definitivamente extintos. Essa previsão, contida no §1º do art. 348 da Lei Complementar nº 214/2025, exige, para tanto, o correto cumprimento das obrigações acessórias estabelecidas pela legislação pelo contribuinte.

Cabe destacar o conteúdo de tal dispositivo:  Fica dispensado o recolhimento do IBS e da CBS relativo aos fatos geradores ocorridos no período indicado no caput em relação aos sujeitos passivos que cumprirem as obrigações acessórias previstas na legislação.

Vale dizer, no curso do ano de 2026, o recolhimento do IBS e da CBS será facultativo para as pessoas jurídicas que cumprirem com as obrigações acessórias previstas em lei. É fato que tal dispositivo ainda deixa margem para dúvidas porque é vago no seu conteúdo – exatamente quais obrigações acessórias previstas em lei? Por isso, acreditamos que sobrevirão outras regulamentações e orientações a respeito. 

Para aqueles contribuintes que optarem por não passar pela fase de experiência e transição, em 2026, o recolhimento do PIS e COFINS, independentemente do regime de apuração, continuará sendo feito de forma integral e completa. 

Manter-se atualizado e agir com planejamento e conhecimento será essencial para atravessar essa fase de implantação da reforma tributária. A Equipe Prolik Advogados está à disposição para auxiliar no que for necessário. 

ITCMD na Reforma Tributária: Regras na tributação de doações e sucessões e as operações relacionadas com o exterior.

Suzanne Dobignies Santos Koslowski

Com a reforma tributária, importantes mudanças no sistema tributário brasileiro estão sendo progressivamente implementadas. Inicialmente, acreditava-se que as medidas estariam restritas à tributação sobre o consumo, por representar a maior parcela da complexidade do sistema tributário nacional.

No entanto, a Emenda Constitucional nº 132/2023 trouxe, também, alterações significativas relacionadas ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), já implementadas, em sua maioria pelo Estado do Paraná.

  • Inventários e Arrolamentos

Uma das mudanças promovidas pela Emenda nº 132 diz respeito à competência para a cobrança do ITCMD em transmissões causa mortis envolvendo bens móveis, títulos e créditos. A nova redação do artigo 155, inciso I, § 1º, inciso II, da Constituição Federal passou a estabelecer que, nesses casos, a competência será, exclusivamente, do Estado de domicílio do falecido (de cujus), e não mais do estado onde se processar o inventário, como previsto anteriormente.

Com essa mudança, deixou de existir vantagem em eventuais escolhas estratégicas de Estados para se processar inventários, com base em alíquotas mais vantajosas.

  • Doações e sucessões internacionais

A Emenda nº 132/2023 também trouxe disposições específicas para a tributação em casos de doações e sucessões internacionais. 

Até então, com fundamento no artigo 155, § 1º, III, da Constituição, os Estados estavam impedidos de instituir a cobrança do ITCMD sobre bens e direitos transmitidos por doadores ou falecidos domiciliados no exterior, sem a prévia regulamentação por meio de Lei Complementar. 

O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Tema 825 da Repercussão Geral, já havia consolidado esse entendimento ao estabelecer a tese de que “é vedado aos Estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da CF/1988 sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional.”

Contudo, a Emenda Constitucional nº 132/2023 excepcionou essa regra ao estabelecer, no artigo 16, que, até a edição da Lei Complementar, o ITCMD, em tais casos, será devido nos seguintes termos:

  • Bens imóveis e respectivos direitos: o imposto será devido ao estado onde o bem estiver localizado ou ao Distrito Federal.
  • Doações em que o doador esteja domiciliado no exterior:
    • Se o donatário for domiciliado no Brasil, o imposto caberá ao estado onde ele residir ou ao Distrito Federal.
    • Se o donatário também residir no exterior, a competência será do estado onde estiver localizado o bem ou do Distrito Federal.
  • Sucessões de bens situados no exterior
    • Se o de cujus era domiciliado no Brasil, o ITCMD será devido ao Estado onde ele residia ou ao Distrito Federal.
    • Se era domiciliado no exterior, o imposto será devido ao estado de domicílio do sucessor ou legatário ou ao Distrito Federal.

Alterações no Estado do Paraná

Com base na Emenda Constitucional n° 132, o Estado do Paraná publicou, em 13/12/2024, a Lei nº 22.262/2024, promovendo adequações na legislação tributária estadual para, dentre outros, incorporar as novas regras do ITCMD.

As alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 132/2023, no que se refere às doações e sucessões internacionais e também à competência para exigir o ITCMD no Estado onde estiver domiciliado o doador, foram incorporadas à legislação estadual e entrarão em vigor em 1º de maio de 2025, respeitando os princípios da anterioridade anual e nonagesimal. 

Quanto à vigência, a única exceção diz respeito à tributação do ITCMD devido ao Paraná nos casos em que o de cujus tiver domicílio nesse estado, relativamente a bens móveis, títulos, créditos e outros bens incorpóreos, transmitidos causa mortis ou por doação, cuja vigência foi estabelecida com efeito retroativo a 21/12/2023, data de publicação da Emenda Constitucional nº 132/2023.

A Expectativa pela Lei Complementar

Atualmente, aguarda apreciação, pelo Senado Federal, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/2024, que busca regulamentar o novo sistema tributário, incluindo o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e também o ITCMD, que até então era regulamentado exclusivamente pelos estados.

No que se refere ao ITCMD, o PLP 108/2024, dentre outras disposições, reflete as já estabelecidas provisoriamente pelo artigo 16 da Emenda Constitucional nº 132/2023. 

Com isso, espera-se que as regras hoje previstas provisoriamente sejam definitivamente incorporadas ao ordenamento jurídico, trazendo maior previsibilidade para os contribuintes.

A equipe de Prolik Advogados está à disposição para as orientações necessárias relativas ao novo tratamento tributário do ITCMD.

Reforma Tributária – Imposto de Renda em pauta

Dra. Sarah Tockus

No último dia 25, o Governo Federal apresentou a 2ª fase da Proposta de Reforma Tributária, com foco no Imposto de Renda, trazendo mudanças em três frentes: pessoa física, pessoa jurídica e investimentos financeiros.

Resumiremos a seguir as principais alterações.

Pessoa Física

Na pessoa física, a proposta trouxe a atualização da tabela do imposto de renda, aumentando em 31% a faixa de isenção, que passa de R$ 1.903,98 para R$ 2.500,00. As demais faixas também receberam reajuste e rendimentos acima de R$ 5.300,01 serão tributados à alíquota máxima de 27,5%:

Fonte: Ministério da Economia

O desconto simplificado de 20%, no entanto, só poderá ser utilizado para quem tem renda de até R$ 40 mil reais por ano. Os demais contribuintes terão de fazer a declaração completa, com os descontos normais de educação, despesas médicas, dentre outras.

Outra mudança interessante é a possibilidade de atualização do valor dos imóveis na declaração de ajuste anual do ano de 2022, mediante o pagamento de uma alíquota reduzida de 5% sobre a valorização indicada na atualização. Isso reduzirá o ganho de capital de uma venda futura, o que seria tributado à uma alíquota que vai de 15% a 22,5%. É um benefício, mas adianta-se um pagamento que seria realizado somente no momento de uma futura venda.

Pessoa Jurídica

Um dos pontos mais polêmicos da Reforma é a tributação dos lucros e dividendos, que hoje são isentos no Brasil.

Pela proposta do Governo serão tributados na fonte em 20%, para contribuintes pessoas físicas ou jurídicas, residentes no Brasil ou no exterior, salvo se o beneficiário for residente em paraíso fiscal, cuja alíquota será de 30%.

Haverá uma isenção para a distribuição de até R$ 20 mil por mês (R$ 240 mil ao ano), apenas para microempresas e empresas de pequeno porte.

O IRPJ sofrerá uma redução de 5 pontos percentuais. Em 2022 passará a 12,5%; e 10% a partir de 2023, mais um adicional de 10% para lucros que superem os R$ 20 mil mensais. Ou seja: 22,5% e 20% respectivamente, mantida a CSLL em 9%.

Não será possível deduzir como despesa operacional o pagamento de gratificações e participações nos resultados pagas a dirigentes e administradores pelo por meio de ações.

A proposta também veda a possibilidade de deduzir juros sobre o capital próprio (JCP).

Há previsão de novas regras para apuração de ganhos de capital em alienação de participações societárias e para a apuração do ganho de capital em alienações indiretas de ativos no Brasil, por empresas no exterior.

Todas as empresas deverão tributar trimestralmente o IRPJ e a CSLL e será permitido compensar 100% do prejuízo de um trimestre nos três seguintes.

Investimentos Financeiros

Bolsa de Valores: a apuração passará de mensal para trimestral, a uma alíquota única de 15% para todos os mercados. A compensação de resultados negativos pode ocorrer entre todas as operações. A isenção de ganho de capital para vendas de até R$ 20 mil em ações em bolsa foi mantida.

Renda Fixa: alíquota única de 15%, com o fim do escalonamento em função do tempo do investimento.

Fundos Abertos: alíquota única de 15%, com o fim do escalonamento em função do tempo de investimento e fim do “come-cotas”. Rendimentos produzidos em 2021, ainda que distribuídos no exercício financeiro seguinte, serão tributados pela alíquota vigente em 2021.

Fundos Fechados: alíquota única de 15% e fim do “come-cotas”.

Fundos de Investimento Imobiliários (FII): fim da isenção dos rendimentos distribuídos a pessoas físicas com cotas negociadas em bolsa a partir de 2022 e alíquota de 15% na distribuição de rendimentos, amortização e alienação de cotas.

Considerações Gerais

A proposta do Governo, embora possua pontos de simplificação, revela claro incremento na tributação e a preocupação com a recomposição dos cofres da União, fruto de toda a crise sanitária que vem sendo vivenciada e do déficit experimentado com o pagamento do auxílio emergencial.

Embora tenha havido um reajuste na faixa de isenção do imposto de renda da pessoa física, o desconto simplificado de 20% fica restrito para quem recebe até R$ 40 mil ao ano. Essa alteração, invariavelmente, vai aumentar a tributação de quem normalmente não deduz despesas com educação e saúde, e que se beneficiaria do desconto simplificado. Como a própria proposta afirma: a medida vai estimular o contribuinte a pedir nota fiscal, e com isso, mais arrecadação.

A possibilidade de atualização do valor patrimonial dos imóveis na declaração de ajuste de 2022, mediante o pagamento da alíquota reduzida de 5% sobre a diferença entre os valores revela claramente a intenção de gerar caixa imediato para o Governo. É um benefício, mas também uma antecipação do imposto que só seria devido em futura venda do bem.

O ponto mais polêmico dessa etapa da Reforma é a tributação dos dividendos. Atualmente isentos, fruto da escolha do legislador de concentrar a tributação na pessoa jurídica e não no sócio, passarão a ser tributados. O modelo divulgado pelo Governo Federal, no entanto, está sobrecarregando a tributação, especialmente das empresas tributadas pelo lucro real, pois mantém a tributação na pessoa jurídica com tímida redução de 5% do IRPJ (considere-se ainda que a CSLL à 9% foi mantida), somando-se a ela a tributação dos dividendos no percentual de 20%, sem permitir que a parcela seja deduzida como despesa da pessoa jurídica. É certo que ainda virão muitas discussões em torno do tema, mas com as mudanças propostas, a carga tributária máxima dos lucros das grandes empresas se aproxima de 43%, o que no momento de recuperação econômica que estamos vivendo é insustentável.

Simplifica Já: a reforma dos municípios

Por Sarah Tockus e Nádia Biscaia

Integrou, mais recentemente, o debate da Reforma Tributária a proposta denominada por “Simplifica Já”, capitaneada pela Frente Nacional de Prefeitos e pela Associação Brasileira de Secretarias de Finanças das Capitais. .

Justificativa

A proposição apresentada perante ao Senado, veiculada enquanto Emenda (de nº 144) à PEC 110, teve por origem a preocupação dos Municípios com os efeitos de uma tributação centralizada. Entende-se, pois, que as propostas das PECs 45 (em especial) e 110 levariam à supressão de maior parte da competência tributária e autonomia dos municípios e, por consequência, da arrecadação municipal.

A criação de um imposto federal sobre o valor agregado condicionaria os Municípios, assim como os Estados, aos repasses federais. Nesse aspecto, grandes arrecadadores de ISS já visualizam a potencial e significativa perda de arrecadação, que vem acompanhada da incerteza quanto à possibilidade de a União promover a abertura de um “fundo de compensação” para repará-las (cfr. neste link).

A par disso, a maior justificativa pela manutenção da proposta “Simplifica já” no cenário nacional encontra-se nos dados que demonstram o crescimento da base de serviços nos últimos anos (de 2006 a 2018 cerca de 282%, enquanto que o ICMS, 186%, – fonte: https://simplificaja.org.br/), influenciando diretamente no aumento da participação municipal no “bolo tributário”.

Comparativo

Uma análise comparativa reflete o seguinte cenário:

(Fonte: https://simplificaja.org.br/)

Aspectos gerais

O Simplifica Já pretende simplificar a tributação e em formato imediato, a partir da (a) fusão do PIS COFINS, inaugurando a “Contribuição sobre o Valor Adicionado federal/Contribuição sobre Bens e Serviços”; (b) transformação do IPI em Imposto Seletivo; e do (c) aprimoramento da legislação do ICMS e do ISS. A ideia posta é unificar o ISS, transformando-o em um imposto nacional, com obrigações acessórias também padronizadas em resoluções de um Comitê Gestor Nacional do ISS. Esta mesma lógica será aplicada ao ICMS, que atualmente se desmembra em 27 legislações estaduais.

A proposta também prevê uma desoneração parcial da folha a partir de uma Contribuição Previdenciária PatronalCPP, cuja alíquota seria inversamente proporcional à massa salarial da empresa. Ou seja: quanto mais empregados a empresa tiver, menor será a alíquota da contribuição patronal. E para compensar uma perda parcial de arrecadação, prevê-se os marketplaces enquanto contribuintes da previdência social. 

Principais características

  • ALÍQUOTA ÚNICA
  • TRIBUTAÇÃO NO DESTINO
  • CRÉDITO FINANCEIRO
  • CADASTRO ÚNICO
  • NOTA FISCAL NACIONAL (VALOR DESTACADO)
  • GUIA DE RECOLHIMENTO ÚNICO
  • PREVISÃO DE DEVOLUÇÃO PARCIAL DOS VALORES PAGOS AO CONTRIBUINTE DE BAIXA RENDA

O ICMS no Simplifica Já

Com legislação de teor nacional, unificada, o ICMS seria cobrado de forma centralizada por um Comitê Gestor. A alíquota incidente sobre as operações interestaduais seria reduzida progressivamente, em até cinco anos, de modo que ao final da transição o ICMS seja cobrado no destino.

Nessa proposta, o imposto “por dentro” deixaria de existir. Seriam fixadas faixas homogêneas por Resolução do Senado, sem possibilidade de redução da base de cálculo pelos Estados, e a substituição do crédito físico pelo crédito financeiro, onde todas as aquisições de mercadorias dariam direito a crédito.

O ISS no Simplifica Já

Igualmente com legislação de teor nacional, unificada, o ISS comportaria alíquotas mínimas e máximas. Nesse sentido, cada município teria uma alíquota interna, aplicável a todos os serviços tributáveis; nas operações intermunicipais, o imposto seria cobrado de forma centralizada por um Comitê Gestor, com destinação da parcela equivalente à alíquota mínima para o município de origem, e a diferença entre a alíquota interna e a alíquota mínima para o município de destino – após uma transição de dez anos.

Quadro geral de alterações propostas

PIS/COFINS contribuição sobre o valor agregado/CBS/IBS
IPI imposto seletivo federal
ICMS legislação nacional do ICMS
ISS legislação nacional do ISS

Conclusão

Na corrida para reformar o sistema constitucional tributário, numerosas propostas são apresentadas, contrapostas e discutidas a fim de observar a melhor prática e privilegiar a simplificação das normas, a contenção da regressividade e a manutenção dos entes federados.

A par disso, a preocupação dos Municípios, em especial aqueles que figuram enquanto grandes arrecadadores do Imposto sobre Serviços, com a potencial perda de receita, é justificada. Mais ainda quando se observa o avanço da economia digital e sua repercussão na tributação nacional e internacional, além da tendência de aumento da participação dos serviços dentro do PIB.

Não obstante à proposta, assim como àquelas já em trâmite nas casas legislativas, sejam dirigidas consideráveis críticas, inclusive de entidades como a ABRASF (cfr. notícia neste link), deve-se considerar o quadro proposto enquanto novo vetor de enriquecimento do debate.

Como insistimos, e bem sabemos, a tributação exerce fundamental papel na manutenção do Estado e da sociedade, de modo que discussões amplas, organizadas e sob diferentes perspectivas são bem-vindas, especialmente quando distanciadas de discursos políticos.

Soma-se ao repertório mais uma perspectiva, uma nova janela aberta para reflexão.

Entre reformas: aspectos gerais das PECs 45 e 110

Por Sarah Tockus e Nádia Rubia Biscaia

A complexidade que permeia o sistema tributário brasileiro, somada à perspectiva econômica negativa e ao crescimento de desigualdades sociais, além de aspectos como a insegurança jurídica e a regressividade, são os pilares erigidos, novamente na história dos tributos (cf. José Souto Maior Borges e José Roberto Vieira), para sustentar discursos de reforma tributária.

Pois bem. Atualmente, são 03 (três) as propostas que despertam atenção no cenário nacional, cujos objetivos comuns são: (i) a simplificação, eficiência e estabilidade jurídica a partir da unificação de tributos; (ii) a eliminação de regimes especiais, mediante tributação do valor agregado; (iii) e a concentração da tributação sobre o consumo.

Nesta oportunidade trataremos de aportar os principais aspectos dos Projetos de Emenda Constitucional de nºs 45 e 110, propostos no âmbito da Câmara dos Deputados e do Senado, respectivamente; não deixando de destacar aos leitores que os contornos do Projeto de Lei nº 3.887/2020, proposto pelo Governo Federal, já foram objeto de detida análise em momento anterior: (link).

1. PEC nº 45

A PEC 45 é a mais avançada em termos de discussão, atualmente. Ela prevê a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), dotado das características próprias do Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA) (“VAT rate”, em inglês) – modelo adotado por numerosos países, em especial aqueles integrantes da União Europeia.

Isso se explica a partir da principal característica deste último: a sua neutralidade, tão própria de um imposto não-cumulativo – cobrado em todas as etapas do processo de produção e comercialização, garantindo em cada etapa o crédito correspondente ao imposto pago na etapa anterior.

1.1 Aspectos da regra-matriz de incidência tributária

O IBS viria em substituição aos cinco tributos atualmente incidentes sobre bens e serviços: PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS; sendo sua receita partilhada entre União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Esta proposta ainda seria complementada por um modelo seletivo, incidente sobre bens e serviços geradores de externalidades negativas, como fumo e bebidas alcoólicas.

O fato gerador do IBS compreenderia as operações onerosas com bens tangíveis e intangíveis, inclusive locações, licenciamentos e cessão de direitos, e serviços.

Por sua vez, a base de cálculo seria “por fora”, ou seja: não contempla seu próprio montante, e durante o período de transição, os cinco tributos que estão sendo substituídos.

O método de apuração se dá pelo sistema de débito e crédito e a escrituração é feita por estabelecimento, com o pagamento centralizado por CNPJ, compensando-se os créditos e débitos de todos os estabelecimentos, mesmo os localizados em municípios distintos.

1.2 Peculiaridades

Dada a perspectiva delineada no âmbito do IBS, a proposta do PEC 45 define um Comitê Gestor nacional do imposto, integrado por representantes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, mas a fiscalização continuará com os entes federados.

Prevê-se, ainda, uma transição progressiva ao longo de dez anos, mantendo-se a carga tributária constante. Uma alíquota inicial de 1% seria mantida por um período de teste de dois anos, reduzindo-se compensatoriamente a alíquota da COFINS. O período de teste serviria não apenas para avaliar o funcionamento do novo imposto, mas também para dimensionar de forma precisa o seu potencial de arrecadação. Após esse período de teste, a alíquota seria completada em mais oito anos, com a elevação progressiva e linear da alíquota, e da simultânea redução das alíquotas dos outros cinco tributos que ao final seriam extintos. Embora não haja previsão expressa, estima-se que a alíquota total seja fixada entre 20 e 25%.

As empresas enquadradas no regime de tributação do Simples Nacional poderiam optar entre: (i) manter o Simples no formato atual, apenas substituindo a referência aos impostos substituídos por uma referência ao IBS, mantendo a destinação da receita aos Estados e Municípios. Nessa alternativa não se apropriariam de crédito do IBS nem transfeririam créditos do imposto; (ii) ou migrar para o regime normal de débito e crédito do IBS, observadas as mesmas condições aplicadas às demais empresas. Nesta alternativa, a alíquota do Simples incidente sobre o faturamento seria reduzida em montante equivalente às parcelas atualmente destinadas ao PIS, COFINS, ICMS, ISS e IPI. As demais incidências sobre o faturamento – IRPJ, CSLL e contribuição patronal seriam mantidas.

A transição também seria feita de forma gradual, ao longo de dez anos, no mesmo ritmo de transição dos tributos atuais para o IBS.

Por fim, um outro aspecto proposto pela PEC 45 é a extinção de isenções e incentivos fiscais, dentre os quais aqueles voltados à Zona Franca de Manaus (ZFM) e às Áreas de Livre Comércio (ALCs).

2. PEC nº 110

Por sua vez, a PEC 110 propõe um modelo de IVA estadual, tal como o IBS, mas em substituição a nove tributos: IPI, IOF, PIS, PASEP, COFINS, CIDE Combustíveis.

Ainda, propõe-se a extinção da CSLL, que seria incorporada ao Imposto de Renda.

Prevê-se, igualmente, a criação do denominado “imposto seletivo” (IS), de competência federal, incidente sobre: energia, telecomunicações, veículos e derivados do petróleo, combustíveis e lubrificantes, e do tabaco.

O crédito é amplo e a alíquota uniforme em todo o território nacional, podendo diferir de acordo com o bem ou serviço.

Esta proposta, diferentemente da anterior, permite a concessão de benefícios fiscais e garante a manutenção do tratamento diferenciado à Zona Franca de Manaus, mediante a concessão de crédito presumido que cubra as diferenças de custo de logística e transporte dos empreendimentos localizados na região.

Parelha como a proposta anterior, a PEC 110 propõe a criação de um órgão nacional, composto pelos fiscos estaduais e municipais, para gerir e fiscalizar o novo imposto.

2.1 Peculiaridades

A PEC 110 contempla matérias não previstas na PEC 45, tais como: (i)a extinção da CSLL; (ii)a ampliação da base de incidência do IPVA para também alcançar a propriedade de embarcações e aviões, transferindo integralmente o produto de sua arrecadação aos municípios;  (iii)propõe que a competência do ITCMD seja transferida dos Estados para a União, destinando a arrecadação aos Municípios; (iv) autoriza a criação de um adicional do IBS para financiar a previdência social; e (iv) propõe a criação de fundos estadual e municipal para reduzir a disparidade de receita entre Estados e Municípios, com recursos destinados a investimentos com infraestrutura.

A transição nesta proposta também se daria em um período inicial de teste, de um ano, com a mesma alíquota de 1% e depois, a transição duraria cinco anos, sendo os atuais tributos substituídos pelos novos à razão de um quinto ao ano.

Veja-se que, diferentemente do que facilmente se sustenta no âmbito da PEC 45 e do modelo da CBS, a PEC 110 não soluciona o impasse (“guerra”) entre Estados e Municípios.

Esses alguns dos principais aspectos das principais propostas de reforma em tramitação.

3. Conclusão

A grande vantagem suscitada no modelo proposto pela PEC 45, assim também como ocorre no modelo CBS, é o afastamento do problema federativo a partir da criação de uma fonte perene de receitas para Estados e Municípios, o que denota extrema importância diante do atual cenário  – especialmente para os Estados – face a tantos questionamentos em torno dos conceitos de “mercadoria” e “serviço”.

Não há como debater a reforma tributária, no entanto, sem contextualizá-la dentro do momento atual que estamos vivenciando: uma crise sanitária mundial sem precedentes, com impacto direto no cenário econômico e fiscal, e que evidencia o crescimento de desigualdades sociais.

Exemplo dessa problemática é a proposta da CBS, do Governo Federal. Se de um lado há a ampliação do direito de crédito, de outro instituiu uma alíquota muito alta, em um momento claramente inoportuno para o setor de serviços, cujo maior custo está naquilo que não admite aproveitamento de créditos.

Vê-se bem que o contexto atual não pode ser desconsiderado, especialmente porque as propostas de reforma também podem reverberar, intensificando desigualdades e acirrando uma crise econômica já existente.

O panorama ora apresentado tem por condão, portanto, destacar os principais aspectos dos dois projetos de emenda constitucional em trâmite, considerando, sobretudo, a retirada do pedido de urgência na tramitação da PL nº 3.887/2020 (CBS) – que impôs a reorganização dos debates que permeiam o tema da reforma.

Se, como bem justificou o presidente Jair Bolsonaro, [a] urgência da CBS [Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços] trancaria a pauta e causaria pressão desnecessária na discussão sobre o tema, que continua prioritário, mas segue ritmo próprio na Comissão Mista da Reforma Tributária” (fonte: Agência Brasil); a perspectiva é de que os debates sejam desenvolvidos com maior acuidade metodológica e jurídica.