Aspectos gerais do Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador

Foi publicada, em 02 de junho de 2021, a Lei Complementar nº 182/2021, que instituiu o Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador (“Marco Legal”), bem como modificou disposições da Lei nº 6.404/1976 (“Lei das S/A”) e da Lei nº 123/2006 (“Lei do Simples Nacional”).

De acordo com o texto legal, dentre outros aspectos, objetiva-se incentivar a constituição de ambientes favoráveis ao empreendedorismo inovador; estimular a produtividade e a competitividade da economia; gerar postos de trabalho qualificados; promover a cooperação e a interação entre os setores público e privado; assim como atrair investimentos estrangeiros.

Para tanto, uma série de medidas foi implementada, das quais merecem destaque as seguintes:

Enquadramento de Empresas Startups e Instrumentos de Investimentos em Inovação

  • São enquadrados como startups o empresário individual, a empresa individual de responsabilidade limitada e as sociedades empresárias, cooperativas e simples, cuja atuação se caracterize pela inovação aplicada a modelo de negócios, produtos ou serviços ofertados, desde que possuam:
  1. receita bruta de até R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) no ano-calendário anterior ou de R$ 1.333.334,00 (um milhão, trezentos e trinta e três mil, trezentos e trinta e quatro reais) multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior, quando inferior a 12 (doze) meses, independentemente da forma societária adotada;
  2. até 10 (dez) anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ); e
  3. declaração em seu ato constitutivo ou alterador de utilização de modelos de negócios inovadores para a geração de produtos ou serviços, em conformidade com o inc. IV, do art. 2º, da Lei nº 10.973/2004; e/ou enquadramento no regime especial Inova Simples, consoante o art. 65-A, da Lei nº 123/2006.
  • As startups poderão admitir aportes de capital por pessoas física ou jurídica ou por fundos de investimentos (“investidores-anjo”), sem que, contudo, tais aportes resultem automaticamente em participação no seu capital social. Logo, o investidor somente será considerado sócio ou acionista da startup após a conversão do instrumento do aporte em efetiva e formal participação societária.
  • O investidor que não possuir participação societária na startup, não possuirá direito a gerência ou a voto na administração da startup, resguardada a possibilidade de participação nas deliberações em caráter estritamente consultivo, conforme estipulação contratual. Igualmente, não responderá por qualquer dívida da startup, inclusive em recuperação judicial, e a ele não se estenderá as hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica previstas na legislação em vigor, salvo nos casos de dolo, fraude ou simulação.

Fomento à Pesquisa, ao Desenvolvimento e à Inovação

  • As empresas que possuírem obrigações de investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação oriundas de outorgas ou delegações firmadas por meio de agências reguladoras ficam autorizadas a cumprir seus compromissos com aporte de recursos em startups.
  • Tais aportes, salvo os casos onde há percentual mínimo destinado a fundos públicos, poderão ocorrer através de fundos patrimoniais voltados à inovação; Fundos de Investimento em Participações (FIPs), desde que autorizados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM); ou investimentos em programas, em editais ou em concursos destinados ao financiamento, à aceleração e à escalabilidade de startups gerenciados por instituições públicas, dentre elas as fundações universitárias, que tenham como finalidade o desenvolvimento de empresas de base tecnológica, de ecossistemas empreendedores e de estímulo à inovação.

Contratação de Soluções Inovadoras pelo Estado

  • No intuito de resolver demandas públicas que exijam solução inovadora com emprego de tecnologia e de promover a inovação no setor produtivo por meio do uso do poder de compra do Estado, os órgãos e as entidades da administração pública poderão contratar pessoas físicas ou jurídicas, isoladamente ou em consórcio, por meio de licitação na modalidade especial.
  • A delimitação do escopo da licitação poderá restringir-se à indicação do problema a ser resolvido e dos resultados esperados pela administração pública, incluídos os desafios tecnológicos a serem superados, dispensada a descrição de eventual solução técnica previamente mapeada e suas especificações técnicas, e caberá aos licitantes propor diferentes meios para a resolução do problema.
  • Os critérios para julgamento das propostas deverão considerar, sem prejuízo de outros definidos em edital, o potencial de resolução do problema pela solução proposta e, se for o caso, da provável economia para a administração pública; o grau de desenvolvimento da solução proposta; a viabilidade e a maturidade do modelo de negócio da solução; a viabilidade econômica da proposta, considerados os recursos financeiros disponíveis para a celebração dos contratos; e a demonstração comparativa de custo e benefício da proposta em relação às opções funcionalmente equivalentes.
  • Após homologação do resultado da licitação, a administração pública celebrará Contrato Público para Solução Inovadora (CPSI), com vigência limitada a 12 (doze) meses, prorrogável por mais um período de até 12 (doze) meses.
  • Encerrado o CPSI, a administração pública poderá celebrar com a mesma contratada, sem nova licitação, contrato para o fornecimento do produto, do processo ou da solução resultante do vínculo anterior ou, se for o caso, para integração da solução à infraestrutura tecnológica ou ao processo de trabalho da administração pública. A vigência do contrato de fornecimento será limitada a 24 (vinte e quatro) meses, prorrogável por mais um período de até 24 (vinte e quatro) meses.

A advogada Letícia Marinhuk, do setor societário da Prolik Advogados, destaca representar, o Marco Legal, evolução significativa ao ambiente das startups. Por outro lado, entende que, para efetivamente ser fiel as suas diretrizes, notadamente estimular a produtividade e a competitividade da economia brasileira, ainda carece de significativas melhoras.

Segundo ela, “é fato que o Marco Legal inovou, em especial ao traçar modelo que facilita a interação das startups com os entes públicos. Não obstante, em essência, deixou a desejar: não há grandes incentivos aos investidores”.

A advogada, neste ponto, contextualiza que, ao se comparar o texto legal com as propostas levadas à discussão do legislativo, não foram acolhidas melhorias, a exemplo das tributárias, que, ao retirar embaraços burocráticos, verdadeiramente criariam cenário atrativo aos investimentos. Exemplo disso são as hipóteses de dedução do imposto de renda e o enquadramento das startups no Simples Nacional.

Por fim, Letícia pontua que o Marco Lei e as alterações dele decorrentes entrarão em vigor em 31/08/2021, nos termos da previsão constante do art. 19 do texto legal.

Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador: breves considerações

Letícia Marinhuk

Foi apresentado, neste 20 de outubro de 2020, pelo Poder Executivo, o Projeto de Lei nº 249/2020 (PLP 249/2020), que tem por condão instituir o Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador. Mas, afinal, quais são os requisitos para uma empresa ser qualificada como startup e quais são os objetivos atrelados a ele?

Consoante o art. 3º, do referido Projeto, “são consideradas startups as organizações empresariais, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados”, constituídas sob a forma de empresário individual, empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI), sociedade empresária ou sociedade simples, e que atendam aos seguintes requisitos:

  • Faturamento bruto anual de até R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) no ano-calendário anterior ou de R$ 1.333.334,00 (um milhão trezentos e trinta e três mil trezentos e trinta e quatro reais) multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior, quando inferior a 12 (doze) meses;
  • Até 6 (seis) anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ); e
  • Possuam, no mínimo, declaração, em seu ato constitutivo ou alterador, de utilização de modelos de negócios inovadores para a geração de produtos ou serviços, em conformidade com o inc. IV, do art. 2º, da Lei nº 10.973/2004; ou enquadramento no regime especial Inova Simples, consoante o art. 65-A, da Lei nº 123/2006.

Para tanto, destacamos abaixo as principais proposições do Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador:

  • Investimento em inovação:

A fim de promover o desenvolvimento das startups, o PL 243/2020 propõe maneiras de a empresa receber aportes de capital por investidores, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, sem que, por sua vez, tais investidores componham, ao menos em um primeiro momento, o quadro de sócios ou acionistas da investida.

De acordo com o art. 4º, são modalidades de aporte o contrato de opção de subscrição de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e a empresa; o contrato de opção de venda de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e os acionistas ou sócios da empresa; debênture conversível emitida pela empresa; contrato de mútuo conversível em participação societária celebrado entre o investidor e a empresa; estruturação de sociedade em conta de participação celebrada entre o investidor e a empresa; ou outros instrumentos de aporte de capital em que o investidor não integre o capital social da empresa.

Neste ponto, vale destacar que, nos termos do art. 6º, ainda que haja o investimento, não serão, os investidores, considerados sócios ou acionistas, nem tampouco possuirão poder de gerência sobre a empresa, embora, a depender das negociações, possam participar das deliberações em caráter consultivo.

Consequentemente, salvo nos casos em que restar comprovado dolo, fraude ou simulação, o investidor não poderá ser responsabilizado pelas dívidas da empresa, inclusive em recuperação judicial, e não se estenderá a ele as hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica existentes na legislação atualmente em vigor.

  • Fomento à pesquisa, ao incentivo e à inovação

As empresas que possuírem obrigações de investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação oriundas de outorgas ou delegações firmadas por meio de agências reguladoras ficam autorizadas a cumprir seus compromissos com aporte de recursos em startups.

Tais aportes, por seu turno, salvo os casos onde há percentual mínimo destinado a fundos públicos, poderão ocorrer através de fundos patrimoniais, na forma da Lei nº 13.800/2019, voltados à inovação; e/ou Fundos de Investimento em Participações (FIPs), desde que autorizados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), nas categorias de capital semente, empresas emergentes e/ou empresas com produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação.

  • Programas de ambiente regulatório experimental:

Nos termos do §2º, do art. 9º, o ambiente regulatório experimental é compreendido como o “conjunto de condições especiais simplificadas para que as pessoas jurídicas participantes possam receber autorização temporária dos órgãos e das entidades com competência de regulamentação setorial para desenvolver modelos de negócios inovadores e testar técnicas e tecnologias experimentais”, estando condicionadas ao atendimentos de critérios e limites a serem previamente estabelecido pelas respectivas autoridades.

A partir disso, tais autoridades regulamentadoras poderão, individualmente ou em colaboração, no âmbito de programas de ambiente regulatório experimental, afastar a incidência de normas sob sua competência em relação à entidade ou grupo de entidades regulados, devendo, para tanto, estabelecer as regras sobre o funcionamento dos programas, sua duração e alcance e os critérios para seleção ou qualificação dos participantes.

  • Contratação de soluções inovadoras pelo Estado:

Subordina os órgãos e as entidades da administração pública direta, autárquica e fundacional, estabelecendo modalidade especial de licitações e de contratos administrativos que tenham por finalidade a resolução de demandas públicas que exijam soluções inovadoras com emprego de tecnologia e a promoção da inovação no setor produtivo, mediante o uso do poder de compra do Estado.

Para tanto, por intermédio de modalidade especial de licitação, a administração pública poderá contratar pessoas físicas ou jurídicas, isoladamente ou em consórcio, para o teste de soluções desenvolvidas ou a pendentes de desenvolvimento, com ou sem risco tecnológico, podendo, inclusive, restringir o processo licitatório a empresas ou consórcio de empresas enquadradas como startups.

Assim, se sancionado, a lei resultante do PL 249/2020 representará considerável avanço nas disposições legais que regem o tema, em especial as do art. 61-A, da Lei 123/2006, que atualmente limitam a participação do investidor na startup a prazo não superior a 7 (sete anos); demarcam a remuneração pelos aportes em período máximo de 5 (cinco) anos e desde que em valor não superior a 50% (cinquenta por cento) dos lucros auferidos pela empresa; e vedam o direito de resgate do investimento, pelo investidor, em prazo inferior 2 (dois) anos do aporte de capital, na hipótese de não ter sido estabelecido vencimento diferenciado no contrato de participação.

Desse modo, considerando justamente o fato de as startups serem empresas ainda em consolidação, voltadas sobretudo à inovação, visa, o Marco Legal, conferir-lhes medidas que estimulem a sua criação e, mais que isso, a sua permanência no mercado. Adicionalmente, busca estabelecer os princípios e as diretrizes para a atuação da administração pública, fomentando e modernizando o ambiente de negócios brasileiro, notadamente no que se refere à contratação de soluções inovadoras.

Vale registrar que, atualmente, a proposição encontra-se apensada ao Projeto de Lei nº 146/2019, que também estabelece medidas voltadas às startups, e ambos seguem aguardando apreciação do Plenário, de acordo com informações disponibilizadas aqui[  pela Câmara dos Deputados.

Sendo notável os avanços sobre o tema, haja vista o reconhecimento da contribuição da startups para o desenvolvimento econômico, social e ambiental do Brasil, espera-se que o Congresso Nacional se sensibilize pelo tema, e sobre ele delibere em curto espaço de tempo.


Governo cria Comitê de Apoio a Start-ups

Em 21/11/2019, publicou-se o Decretou nº 10.122/2019, que cria o “Comitê Nacional de Iniciativas de Apoio a Start-ups, com o objetivo de articular as iniciativas do Poder Executivo federal destinadas às empresas nascentes de base tecnológica que se enquadrem como start-ups”.

O Comitê será composto por representantes de entidades como BNDES, Banco Central, Apex Brasil, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, entre outras. Caberá ao Comitê: (a) promover troca de experiências e boas práticas em iniciativas que envolvam o apoio às start-ups; (b) disponibilizar e atualizar plataforma em formato digital com registro de iniciativas públicas de apoio a start-ups; e (c) coletar e avaliar as informações sobre as iniciativas de apoio às start-ups e os resultados obtidos.

A sociedade civil poderá contribuir para o Comitê por meio da participação em grupos consultivos técnicos, que poderão ser instituídos para auxiliar na formulação de propostas e recomendações relativas às competências do Comitê. Os membros do grupo consultivo técnico serão escolhidos dentre especialistas de notório saber na área de empreendedorismo e inovação.

No início de dezembro de cada ano, o Comitê deverá apresentar aos Ministro da Economia e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações relatório de acompanhamento das atividades executadas durante o exercício.

Esse Decreto vai ao encontro de outras iniciativas do Governo Federal ao longo de 2019 que têm por objetivo incentivar o empreendedorismo e a desburocratização. Nesse contexto, a advogada Flávia Lubieska N. Kischelewski recorda que, em abril, foi publicada a Lei Complementar nº 167/2019, que instituiu o Inova Simples, regime especial simplificado que torna mais ágil os procedimentos para abertura e fechamento de empresas.

Nos termos dessa Lei Complementar, “considera-se startup a empresa de caráter inovador que visa a aperfeiçoar sistemas, métodos ou modelos de negócio, de produção, de serviços ou de produtos, os quais, quando já existentes, caracterizam startups de natureza incremental, ou, quando relacionados à criação de algo totalmente novo, caracterizam startups de natureza disruptiva”.