Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador: breves considerações

Letícia Marinhuk

Foi apresentado, neste 20 de outubro de 2020, pelo Poder Executivo, o Projeto de Lei nº 249/2020 (PLP 249/2020), que tem por condão instituir o Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador. Mas, afinal, quais são os requisitos para uma empresa ser qualificada como startup e quais são os objetivos atrelados a ele?

Consoante o art. 3º, do referido Projeto, “são consideradas startups as organizações empresariais, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados”, constituídas sob a forma de empresário individual, empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI), sociedade empresária ou sociedade simples, e que atendam aos seguintes requisitos:

  • Faturamento bruto anual de até R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) no ano-calendário anterior ou de R$ 1.333.334,00 (um milhão trezentos e trinta e três mil trezentos e trinta e quatro reais) multiplicado pelo número de meses de atividade no ano-calendário anterior, quando inferior a 12 (doze) meses;
  • Até 6 (seis) anos de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ); e
  • Possuam, no mínimo, declaração, em seu ato constitutivo ou alterador, de utilização de modelos de negócios inovadores para a geração de produtos ou serviços, em conformidade com o inc. IV, do art. 2º, da Lei nº 10.973/2004; ou enquadramento no regime especial Inova Simples, consoante o art. 65-A, da Lei nº 123/2006.

Para tanto, destacamos abaixo as principais proposições do Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador:

  • Investimento em inovação:

A fim de promover o desenvolvimento das startups, o PL 243/2020 propõe maneiras de a empresa receber aportes de capital por investidores, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, sem que, por sua vez, tais investidores componham, ao menos em um primeiro momento, o quadro de sócios ou acionistas da investida.

De acordo com o art. 4º, são modalidades de aporte o contrato de opção de subscrição de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e a empresa; o contrato de opção de venda de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e os acionistas ou sócios da empresa; debênture conversível emitida pela empresa; contrato de mútuo conversível em participação societária celebrado entre o investidor e a empresa; estruturação de sociedade em conta de participação celebrada entre o investidor e a empresa; ou outros instrumentos de aporte de capital em que o investidor não integre o capital social da empresa.

Neste ponto, vale destacar que, nos termos do art. 6º, ainda que haja o investimento, não serão, os investidores, considerados sócios ou acionistas, nem tampouco possuirão poder de gerência sobre a empresa, embora, a depender das negociações, possam participar das deliberações em caráter consultivo.

Consequentemente, salvo nos casos em que restar comprovado dolo, fraude ou simulação, o investidor não poderá ser responsabilizado pelas dívidas da empresa, inclusive em recuperação judicial, e não se estenderá a ele as hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica existentes na legislação atualmente em vigor.

  • Fomento à pesquisa, ao incentivo e à inovação

As empresas que possuírem obrigações de investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação oriundas de outorgas ou delegações firmadas por meio de agências reguladoras ficam autorizadas a cumprir seus compromissos com aporte de recursos em startups.

Tais aportes, por seu turno, salvo os casos onde há percentual mínimo destinado a fundos públicos, poderão ocorrer através de fundos patrimoniais, na forma da Lei nº 13.800/2019, voltados à inovação; e/ou Fundos de Investimento em Participações (FIPs), desde que autorizados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), nas categorias de capital semente, empresas emergentes e/ou empresas com produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação.

  • Programas de ambiente regulatório experimental:

Nos termos do §2º, do art. 9º, o ambiente regulatório experimental é compreendido como o “conjunto de condições especiais simplificadas para que as pessoas jurídicas participantes possam receber autorização temporária dos órgãos e das entidades com competência de regulamentação setorial para desenvolver modelos de negócios inovadores e testar técnicas e tecnologias experimentais”, estando condicionadas ao atendimentos de critérios e limites a serem previamente estabelecido pelas respectivas autoridades.

A partir disso, tais autoridades regulamentadoras poderão, individualmente ou em colaboração, no âmbito de programas de ambiente regulatório experimental, afastar a incidência de normas sob sua competência em relação à entidade ou grupo de entidades regulados, devendo, para tanto, estabelecer as regras sobre o funcionamento dos programas, sua duração e alcance e os critérios para seleção ou qualificação dos participantes.

  • Contratação de soluções inovadoras pelo Estado:

Subordina os órgãos e as entidades da administração pública direta, autárquica e fundacional, estabelecendo modalidade especial de licitações e de contratos administrativos que tenham por finalidade a resolução de demandas públicas que exijam soluções inovadoras com emprego de tecnologia e a promoção da inovação no setor produtivo, mediante o uso do poder de compra do Estado.

Para tanto, por intermédio de modalidade especial de licitação, a administração pública poderá contratar pessoas físicas ou jurídicas, isoladamente ou em consórcio, para o teste de soluções desenvolvidas ou a pendentes de desenvolvimento, com ou sem risco tecnológico, podendo, inclusive, restringir o processo licitatório a empresas ou consórcio de empresas enquadradas como startups.

Assim, se sancionado, a lei resultante do PL 249/2020 representará considerável avanço nas disposições legais que regem o tema, em especial as do art. 61-A, da Lei 123/2006, que atualmente limitam a participação do investidor na startup a prazo não superior a 7 (sete anos); demarcam a remuneração pelos aportes em período máximo de 5 (cinco) anos e desde que em valor não superior a 50% (cinquenta por cento) dos lucros auferidos pela empresa; e vedam o direito de resgate do investimento, pelo investidor, em prazo inferior 2 (dois) anos do aporte de capital, na hipótese de não ter sido estabelecido vencimento diferenciado no contrato de participação.

Desse modo, considerando justamente o fato de as startups serem empresas ainda em consolidação, voltadas sobretudo à inovação, visa, o Marco Legal, conferir-lhes medidas que estimulem a sua criação e, mais que isso, a sua permanência no mercado. Adicionalmente, busca estabelecer os princípios e as diretrizes para a atuação da administração pública, fomentando e modernizando o ambiente de negócios brasileiro, notadamente no que se refere à contratação de soluções inovadoras.

Vale registrar que, atualmente, a proposição encontra-se apensada ao Projeto de Lei nº 146/2019, que também estabelece medidas voltadas às startups, e ambos seguem aguardando apreciação do Plenário, de acordo com informações disponibilizadas aqui[  pela Câmara dos Deputados.

Sendo notável os avanços sobre o tema, haja vista o reconhecimento da contribuição da startups para o desenvolvimento econômico, social e ambiental do Brasil, espera-se que o Congresso Nacional se sensibilize pelo tema, e sobre ele delibere em curto espaço de tempo.


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