Programa de Conformidade Fiscal Cooperativa do Estado do Paraná – Confia Paraná.

Suzanne Dobignies Santos Koslowski

O Governo do Paraná instituiu, por meio da Lei nº 22.480, de 18.06.2025, o Programa de Conformidade Fiscal Cooperativa – CONFIA Paraná, que objetiva a cooperação entre a Administração Tributária e os contribuintes do ICMS, com foco em:

  • redução da burocracia tributária estadual;
  • estímulo às boas práticas de conformidade fiscal;
  • incentivo à autorregularização como forma de prevenir ou corrigir falhas no cumprimento de obrigações;
  • utilização de ferramentas digitais para simplificar procedimentos fiscais.

Agora, recentemente, regulamentou o Programa, por meio do Decreto nº 11.056, de 28.08.2025 e da Norma de Procedimento Administrativo REPR nº 3, de 04.09.2025. Ambos atos normativos disciplinam a organização, os processos e as atribuições das estruturas responsáveis pela gestão e execução do Programa.

De acordo com a regulamentação, a Receita Estadual oferecerá meios ágeis e eletrônicos para que os contribuintes regularizem espontaneamente eventuais inconsistências. A comunicação será feita pelos canais oficiais, de forma automatizada, por meio do sistema próprio do CONFIA.

Caso não haja regularização, a situação poderá resultar na abertura de ação fiscal e na aplicação das penalidades previstas em lei. O Decreto também estabelece que não será admitida autorregularização quando já houver ação fiscal em curso, conforme a legislação aplicável.

Outro ponto central é a classificação dos contribuintes em cinco categorias de conformidade: A, B, C, D e NC (não classificados). Até o momento, as legislações indicam apenas a existência das categorias e dos critérios gerais, sem detalhar objetivamente as regras de enquadramento. Entretanto, os contribuintes poderão requerer, justificadamente, a correção, exclusivamente nos casos de erro material ou de aplicação incorreta dos critérios estabelecidos no âmbito do Confia Paraná, nos termos estabelecidos no Decreto.

De qualquer forma, a análise para o enquadramento considerará diversos fatores, abrangendo todos os estabelecimentos do contribuinte, conforme definido na Lei nº 22.480/2025. 

Entre eles estão: histórico de cumprimento das obrigações, participação em programas de autorregularização, relação com fornecedores, resultados de verificações fiscais, porte econômico, setor de atividade e grau de relacionamento com a administração tributária.

Quanto aos benefícios, a legislação lista vantagens para as categorias A e B, sendo a categoria “A” a que recebe os principais incentivos. De modo geral, quanto maior o nível de conformidade, melhor será a classificação do contribuinte e maiores serão os benefícios. Entre eles destacam-se:

  • Categoria A: Todas as vantagens previstas para a categoria B (informadas abaixo), além de além de análise prioritária de pedidos de enquadramento no Programa Paraná Competitivo (ou outro que o substitua), em projetos de expansão, diversificação ou reativação de estabelecimentos; recuperação em conta-gráfica de imposto indevidamente pago, sem necessidade de procedimento administrativo, na forma regulamentar (ressalvado o direito da Fazenda Pública de revisar os lançamentos no prazo legal); renovação simplificada de regimes especiais concedidos com fundamento no art. 42 da Lei nº 11.580/96; e ampliação dos limites e condições para utilização de créditos acumulados habilitados no SISCRED, inclusive para pagamento de fornecedores, conforme resolução do Secretário de Estado da Fazenda.
  • Categorias B: Tramitação prioritária de processos, condições diferenciadas para ajustes de inconsistências, prazos especiais para pagamento do ICMS, inscrição simplificada de novos estabelecimentos, prioridade em consultas tributárias, pagamento do ICMS relativo à importação de mercadorias do exterior em conta-gráfica (observadas as restrições por produto ou atividade econômica, quando existentes) e dilação do prazo de pagamento do imposto declarado, desde que dentro do mesmo mês do vencimento original.

O CONFIA Paraná estabelece ainda instrumentos de controle para impedir o uso indevido dos benefícios. Caso sejam identificados indícios de dolo, fraude ou simulação, a Receita Estadual poderá suspender, restringir ou revogar as vantagens concedidas, mediante procedimento administrativo, com garantia do contraditório e da ampla defesa.

A gestão do Programa, sua estrutura organizacional e demais disposições necessárias ao funcionamento estão disciplinadas pela Norma de Procedimento Administrativo REPR nº 3/2025.

Por fim, a SEFA/PR criará e manterá um portal público do CONFIA Paraná, que deverá ser acompanhado pelas empresas para avaliar os benefícios disponíveis e aproveitar as oportunidades de autorregularização e fortalecimento da conformidade fiscal.

A equipe do Prolik Advogados permanece à disposição para prestar as orientações necessárias sobre o Programa.

CVM cria o FÁCIL para permitir mais companhias acessarem o mercado de capitais.

Flávia Lubieska Kischelewski

Com a edição das Resoluções CVM nº 231 e nº 232, ambas de 3 de julho de 2025, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) instituiu o Regime FÁCIL – Facilitação do Acesso a Capital e de Incentivos a Listagens –, com o objetivo de ampliar o acesso de companhias de menor porte (CMPs) ao mercado brasileiro de capitais. O novo conjunto normativo vigorará a partir de janeiro de 2026 e será aplicável às sociedades anônimas com receita bruta anual consolidada inferior a R$ 500 milhões e listadas em mercado organizado de valores mobiliários. A proposta visa suprir uma demanda antiga, mediante a sistema mais simplificado e menos oneroso.

O surgimento do FÁCIL atende a uma demanda antiga: a existência de um vazio regulatório entre o crowdfunding (modalidade de captação pública regulada pela CVM por meio de plataformas online autorizadas), que passou a ser disciplinado pela Resolução CVM nº 88, que se destina a empresas com receita de até R$ 40 milhões e captação limitada a R$ 15 milhões, e o regime tradicional de ofertas públicas, regulado pela Resolução CVM nº 160, cujas exigências são comparáveis às impostas a grandes companhias abertas. Para muitas empresas, essa disparidade tornava o mercado de capitais uma alternativa inviável, já que os custos fixos e as obrigações acessórias pesavam de forma desproporcional, fazendo que companhias buscassem outros meios financiamentos.

Ao criar um regime intermediário, a CVM sinaliza um movimento importante de incentivo ao acesso ao crédito privado às CMPs, reconhecendo que a proporcionalidade de regras regulatórias compatíveis com seu porte é essencial para ampliar sua competitividade no mercado, inclusive de capitais nacional. Vale salientar, ainda, que o Fácil é fruto de uma construção coletiva, posterior à realização de consulta pública realizada em 2024, ou seja, com a participação da sociedade civil, que contribuiu diretamente na construção das Resoluções CVM promulgadas recentemente.

Para usufruir desse regime, a partir de 2026, a companhia deverá observar alguns requisitos básicos: ser constituída sob a forma de sociedade anônima, apresentar receita bruta consolidada inferior a R$ 500 milhões no último exercício, ter suas demonstrações auditadas por auditor registrado na CVM e manter listagem em mercado organizado. A classificação como CMP não substitui as categorias tradicionais de registro (A ou B), mas se sobrepõe a elas para fins da aplicação das regras simplificadas. Esse desenho é relevante porque mantém uma estrutura regulatória já consolidada, ao mesmo tempo em que insere uma camada adicional de flexibilização para empresas de menor porte. Outro ponto importante é que a migração de companhias já registradas para o FÁCIL exige anuência dos titulares dos valores mobiliários em circulação, o que confere segurança jurídica e respeito à vontade dos investidores.

Entre as principais inovações, destaca-se a criação do Formulário FÁCIL, que substitui documentos antes exigidos em separado, como o Formulário de Referência, o prospecto e a lâmina. Essa mudança reduz redundâncias informacionais e simplifica processos sem eliminar a necessidade de transparência. O Formulário deve ser atualizado anualmente ou em até 14 dias úteis quando ocorrerem alterações relevantes, como mudança de administradores, modificações significativas na composição acionária ou no capital social. Essa abordagem reflete a tentativa da CVM de equilibrar dois objetivos, isto é, diminuir custos regulatórios e assegurar que o mercado disponha de informações suficientes para decisões de investimento.

Outro aspecto importante é a flexibilização das obrigações periódicas, o que implica menos burocracia e custo às CMPs. No lugar dos tradicionais relatórios trimestrais (ITR), admite-se a entrega de informações semestrais (ISEM), com prazo estendido para 60 dias. No campo da governança, foram concedidas dispensas relevantes, como a não obrigatoriedade de disponibilização do sistema de voto a distância e a desobrigação do envio de políticas internas para a CVM, além da flexibilização no quórum de aceitação para cancelamento de registro em ofertas públicas de aquisição (OPA), que passa a ser de 50% das ações em circulação, em vez dos dois terços exigidos no regime geral.

Um outro ponto relevante é a dispensa da obrigatoriedade do relatório de sustentabilidade previsto na Resolução CVM nº 193, que passa a ser facultativo para as companhias enquadradas no FÁCIL. A exigência anterior de divulgação de informações ESG (Environmental, Social and Governance) era frequentemente considerada onerosa para estruturas enxutas como as das CMPs, podendo desestimular sua entrada no mercado de capitais. Com a flexibilização, busca-se reduzir barreiras sem impedir a divulgação voluntária dessas informações, prática que continua alinhada às tendências globais. Essa escolha demonstra que a CVM optou por uma estratégia pragmática, priorizando a inclusão e a viabilidade econômica, sem descartar a possibilidade de evolução futura em direção a práticas mais avançadas de sustentabilidade.

No tocante às ofertas públicas, o FÁCIL introduz modalidades adaptadas ao porte das empresas. As companhias poderão seguir as regras completas da Resolução CVM nº 160, sem limitação de valor ou optar pelo rito simplificado, com ofertas limitadas a R$ 300 milhões por período de 12 meses. Nessas operações simplificadas, o Formulário FÁCIL substitui prospecto e lâmina, reforçando a lógica de padronização e desburocratização. Além disso, o regime inova ao permitir a realização de ofertas públicas diretas, sem necessidade de intermediação por instituição financeira e sem registro prévio na CVM, desde que observados os limites e condições previstos. Essa possibilidade pode ampliar a eficiência e reduzir custos de transação, sobretudo em emissões de dívida voltadas a investidores profissionais, mas também traz desafios relacionados à supervisão e à mitigação de riscos operacionais, uma vez que a análise passa a ser conduzida pela entidade administradora do mercado organizado onde a companhia estiver listada.

Além das companhias registradas na CVM, o FÁCIL também contempla a possibilidade de ofertas públicas por companhias de menor porte não registradas, desde que observados requisitos específicos. Nessas hipóteses, as ofertas deverão ser limitadas a valores mobiliários representativos de dívida e destinadas exclusivamente a investidores profissionais, dispensando-se tanto o registro da companhia como a contratação de coordenador da oferta. A responsabilidade pela obtenção das informações necessárias para avaliação do investimento recai integralmente sobre os investidores profissionais, de forma similar ao que ocorre nas ofertas com esforços restritos sob a Resolução CVM nº 160.

A descentralização da supervisão é, de fato, um dos pontos mais relevantes do FÁCIL. Ao delegar às entidades de mercado organizado atribuições como a análise prévia de documentos e o monitoramento das ofertas diretas, a CVM reforça a tentativa de simplificar a burocracia e conferir maior agilidade aos processos. No entanto, esse modelo pressupõe que tais entidades mantenham elevados padrões de governança e fiscalização, sob pena de comprometer a efetividade do regime. Essa dinâmica demanda robustez institucional e alinhamento regulatório, a fim de assegurar que a simplificação não se converta em fragilidade.

De maneira geral, o FÁCIL se insere em um conjunto de medidas voltadas à ampliação das possibilidades de captação diretas por companhias de menor porte, sem afastar princípios essenciais de transparência e segurança jurídica. Trata-se de um movimento que aposta na proporcionalidade regulatória e simplificação como mecanismo de inclusão, sem renunciar a estrutura básica de proteção ao investidor. 

A efetividade desse regime dependerá, em larga medida, da sua aceitação pelo mercado, da capacidade das entidades administradoras de desempenhar o papel regulatório que lhes foi delegado e do acompanhamento contínuo da CVM, especialmente para avaliar se a desoneração regulatória produz o efeito desejado sem comprometer a integridade do sistema. Em síntese, o FÁCIL não deve ser visto apenas como uma flexibilização normativa, mas como uma estratégia regulatória que busca harmonizar eficiência, transparência e desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro.

CNPJ alfanumérico: o que muda a partir de 2026.

Isadora Boroni Valério Simonetti

A Receita Federal do Brasil (RFB) implementará, a partir de julho de 2026, uma mudança fundamental na estrutura do Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ), que passará de um formato exclusivamente numérico para um modelo alfanumérico.

A modificação está prevista na Instrução Normativa RFB nº 2.229/2024, publicada pela Receita Federal, e tem como finalidade a ampliação da capacidade do sistema de identificação empresarial nacional. Atualmente, o formato exclusivamente numérico do CNPJ se aproxima de seu limite técnico, com cerca de 60 milhões de inscrições já emitidas, num total possível de aproximadamente 99,9 milhões. A introdução de caracteres alfanuméricos expande esse número para aproximadamente um trilhão de combinações, garantindo sustentabilidade a longo prazo.

Trata-se de medida que também se insere em um esforço mais amplo de modernização da administração tributária e do ambiente de negócios, alinhando-se às diretrizes da Reforma Tributária (Lei Complementar nº 214/2023). O novo modelo visa promover a integração entre os cadastros das esferas federal, estadual e municipal, bem como simplificar procedimentos relacionados à abertura e ao licenciamento de empresas.

Estrutura do Novo CNPJ

Embora o número de dígitos permaneça inalterado (14), a composição do CNPJ será modificada:

  • As 8 primeiras posições (raiz do CNPJ) e as 4 seguintes (identificação do estabelecimento ou filial), atualmente numéricas, passarão a ser alfanuméricas;
  • Os 2 últimos dígitos (dígitos verificadores) permanecerão numéricos, mas seu cálculo será adaptado para considerar a conversão de letras em valores numéricos, utilizando o algoritmo Módulo 11 com base na tabela ASCII.

A Receita Federal fornecerá rotinas de cálculo e orientações técnicas para suporte à implementação.

Importante destacar:

  • Os CNPJs já existentes não serão alterados. A nova estrutura será aplicável exclusivamente aos cadastros emitidos a partir da vigência da norma.
  • O principal impacto será nos sistemas de tecnologia da informação, que deverão ser adequados para reconhecer, armazenar, validar e processar o novo padrão. Isso abrange softwares de gestão, contabilidade, emissores de documentos eletrônicos (NF-e, NFC-e etc.), e quaisquer outras ferramentas que utilizem campos de CNPJ.

A advogada Isadora Boroni Valério Simonetti ressalta que a medida implementada pela RFB visa garantir a manutenção e expansão da base cadastral de pessoas jurídicas, com impactos diretos na dinâmica empresarial. Ainda que a mudança não altere os registros já existentes, impõe-se aos profissionais o dever de acompanhar a transição e assegurar que seus sistemas e soluções tecnológicas estejam compatíveis com o novo formato alfanumérico do CNPJ.