A teoria da perda de uma chance

Por Manuella de Oliveira Moraes

Tendo em vista a capacidade que o direito possui de acompanhar a evolução da sociedade para garantir uma interpretação e aplicação adequada às ocasiões, a análise da teoria da perda de uma chance revela-se de grande valor ao ordenamento jurídico brasileiro.

Isso porque, o dano causado pela oportunidade perdida ou expectativa frustrada do ser humano, também, carece de uma justa reparação.

Neste contexto, emerge a teoria da perda de uma chance que visa a reparação do dano, causado por um agressor, que inviabiliza a vítima de alcançar um resultado esperado, impedindo-a de obter uma posição mais benéfica.

Outrossim, para configuração do instituto é necessário a presença dos pressupostos da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta do agente, a existência de um dano e o nexo de causalidade entre eles.

Deste modo, resta identificada a perda de uma chance quando a prática de um ato ilícito por um terceiro interrompe o curso normal dos eventos e impossibilita a obtenção de algo que era esperado pela vítima, seja um resultado positivo ou não ocorrência de um prejuízo, gerando um dano a ser reparado.

O próprio nome da teoria – perda da chance – já nos faz compreender que a indenização cabível se dá pela oportunidade perdida e não pela vantagem final esperada.

Nesse viés, a responsabilidade civil pela perda de uma chance baseia-se no direito à reparação em virtude do dano, não necessariamente de alcançar determinada coisa, mas de tentar alcança-la.

Ou seja, não existe a pretensão de indenizar a perda do resultado e sim da oportunidade.

Contudo, para a concessão da indenização com base na responsabilidade civil pela perda de uma chance é imprescindível que essa chance seja séria e real, e não uma mera esperança ou desejo.

Assim, o dever de reparar o dano somente se materializa após a verificação do caso concreto, considerando principalmente a razoabilidade e probabilidade da existência do resultado que a vítima almejava e que alega ter perdido.

Por conseguinte, a probabilidade de o êxito ter sido alcançado deve ser real e comprovada. Até mesmo porque é a partir desta probabilidade que se irá mensurar a extensão do dano e a indenização a ser percebida.

Esta teoria surgiu e se desenvolveu na França, posteriormente, também, foi muito estudada pelos italianos, ingleses e norte-americanos.

No Brasil, todavia, o Código Civil de 2002 não faz referência específica a esta modalidade da responsabilidade civil, remanescendo para a doutrina e a jurisprudência o seu aproveitamento.

Não obstante, ainda há muita discussão sobre a temática. O problema fundamental se encontra justamente pela teoria estar baseada, como já relatado acima, na probabilidade, dificultando à aferição do valor da indenização.

Sendo assim, não restam dúvidas quanto a aplicação da teoria pelas decisões e interpretações destes tribunais. Porém, as indenizações, na maioria dos casos, são baseadas em outros institutos, tais como o dano moral ou lucros cessantes, devido à inexistência de critérios para uma adequada classificação.

No Brasil há diversos julgados que aplicam dita teoria, podendo ser citados casos de erros médicos; culpa profissional do advogado; descumprimento contratual e responsabilidade civil do Estado.

O caso mais emblemático acerca deste tema foi o REsp 788.459/BA, de 2005, que tratava do programa Show do Milhão, no qual a participante deixou de ganhar o prêmio em razão da pergunta final não ter resposta correta.

Em recente julgado, o STJ condenou as empresas organizadoras do programa Amazônia – reality show, exibido pela TV Record em 2012, ao pagamento de R$ 125 mil a um participante que foi eliminado por erro na contagem de pontos na semifinal da competição.

Para Villas Bôas Cueva, relator do caso, embora o resultado final dependesse da vitória do competidor em mais duas provas, não há como afastar a aplicação da teoria da perda de uma chance, “pois sua eliminação de forma indevida e contrária às regras da competição interrompeu um fluxo possível dos eventos”.

O ministro esclareceu que para quantificar o dano, foi investigado que se o autor tivesse participado da próxima rodada, ele teria, em tese, 50% de probabilidade de sair vencedor da semifinal. Em seguida, na fase final, a chance de êxito também seria de 50%, concluindo-se que a probabilidade total de obter a vantagem esperada – a vitória na competição – era de 25% do total do prêmio.

 

2 pensou em “A teoria da perda de uma chance

  1. Excelente artigo.
    Não conhecia essa matéria. Bastante interessante.
    Sergio Guarita

  2. Bom dia
    Lendo esse artigo, fiquei pensando no futebol, se um erro do juiz impede o time de disputar a final, teremos muitos problemas…..imagine a confusão…..

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