O planejamento tributário na berlinda

Por Matheus Monteiro Morosini.

Dr. Matheus Monteiro Morosini é advogado tributarista.

Dr. Matheus Monteiro Morosini é advogado tributarista.

No final do mês de julho, foi publicada a Medida Provisória (MP) nº. 685 que, dentre outros temas, instituiu o Programa de Redução de Litígios tributários (Prolelit) e estabeleceu a obrigatoriedade dos contribuintes declararem ao Fisco as operações de planejamento tributário.

O atual cenário econômico demanda mesmo algumas medidas por parte do Governo, sendo a redução de litígios tributários e a transparência fiscal importantes mecanismos para tanto.

Contudo, na forma em que a MP nº. 685 foi implementada, esses objetivos dificilmente serão alcançados, denotando-se da medida a precípua intenção arrecadadora, a par dos preceitos norteadores do sistema tributário.

Especificamente no que se refere ao planejamento tributário, o ato imputa ao contribuinte mais uma obrigação acessória, visando a permitir à Receita Federal do Brasil um maior controle sobre reorganizações societárias e outros atos que impliquem na suspensão, redução ou diferimento de tributos.

Além da infinidade de deveres instrumentais que os contribuintes já devem cumprir para alimentar o Fisco com as informações que entende necessárias, muitas de alta complexidade e que consomem um bom fôlego das empresas, agora, os contribuintes se deparam com a obrigatoriedade de terem que declarar à Receita Federal, até o dia 30 de setembro do ano-calendário seguinte, suas operações de planejamento tributário.

Caso a operação não seja acatada, a empresa deverá pagar, em até 30 dias, os tributos que teria economizado, acrescidos de juros moratórios. Não haverá multa.

Por outro lado, a falta de entrega da declaração ou o cumprimento considerado ineficaz será caracterizado (presumidamente) como omissão dolosa com intuito de sonegação ou fraude e acarretará na exigência do tributo que deixou de ser recolhido acrescido de juros e multa agravada na ordem de 150%.

Tendo em vista ser essa uma tendência mundial na relação entre contribuintes e Fisco, e como a validade dos atos e negócios jurídicos pressupõe a sua licitude, poderia se entender que o único incômodo da declaração de planejamento tributário residiria na responsabilidade por mais uma dever acessório.

Ocorre que a medida tem gerado longos e acalorados debates, principalmente pelo fato de o Governo ter se utilizado de conceitos vagos e subjetivos para definir o campo de atuação da fiscalização tributária (como “razões extratributárias relevantes” e “estrutura não usual”), deixando o contribuinte ao livre alvitre da fiscalização, em um ambiente de certa insegurança jurídica.

Nesse vasto campo de discricionariedade concedido, a regulamentação poderá ir muito além do que seria razoável e imaginável.

Não bastasse isso, a MP nº. 685 (art. 12) ainda prevê que a mera ausência de declaração do planejamento tributário pressupõe uma omissão dolosa do contribuinte com intuito de sonegação ou fraude, o que também vai contra as diretrizes básicas do direito tributário e do direito penal.

O valor da multa agravada, correspondente a 150% dos tributos considerados indevidamente suprimidos/omitidos, não observa os parâmetros já fixados pelo Supremo Tribunal Federal para considerar uma multa confiscatória.

O ambiente de grande controvérsia sobre o tema tem refletido na tramitação da MP nº. 685, de 2015, no Congresso Nacional, com a apresentação de mais de duzentas emendas, sendo que boa parte delas visando justamente à supressão dos dispositivos que instituíram a declaração de planejamento tributário.

E, a discussão já foi parar no Judiciário, através de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) – ADI nº. 5.366. O PSB sustenta a inconstitucionalidade da nova obrigação, pelos seguintes fundamentos: ausência do requisito da urgência para a edição da medida provisória; impossibilidade de medida provisória tratar de temas de direito penal/processual penal; ofensa à segurança jurídica e à livre iniciativa; violação aos princípios da presunção da inocência, da ampla defesa, contraditório e do devido processo legal; ilegalidade na utilização de tributo como sanção; e a afronta ao não confisco.

Desse cenário, extrai-se que a questão está longe de uma solução e ainda vai gera muitos debates.

Os contribuintes devem ficar atentos à regulamentação a ser editada pela Receita Federal (para verificar o exato alcance da obrigação e seus efeitos), não perdendo de vista a possibilidade de o Congresso Nacional rechaçar a medida ou do STF declarar sua inconstitucionalidade.

É aguardar para ver!

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