Refis da Crise: honorários e encargo legal sobre dívidas previdenciárias são indevidos

Por Janaina Baggio.

Dra. Janaina explica.

Dra. Janaina explica.

Os contribuintes que aderiram ao pagamento ou parcelamento instituído pela Lei nº 11.941/2009, cujo prazo de adesão foi reaberto pelas Leis nºs 12.865/2013, 12.973/2014 e 12.996/2014, podem questionar a cobrança dos “honorários previdenciários” e do “encargo legal”, relativamente aos débitos inscritos em dívida ativa de natureza previdenciária. Necessário observar que as duas prestações têm características e períodos de incidência distintos.

O chamado “encargo legal” teve sua cobrança estabelecida, originalmente, em relação aos débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal e inscritos em dívida ativa, na proporção de 20% do valor devido. Instituído em 1969 pelo Decreto-lei n.º 1.025, teve por finalidade acrescer as despesas inerentes à cobrança, inclusive a verba honorária.

Os “honorários previdenciários”, por sua vez, eram somados aos débitos dessa natureza quando administrados pelo então Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A cobrança estava fundamentada no art. 20 do Código de Processo Civil, sendo o valor usualmente calculado na proporção de 10% sobre o montante do débito. A finalidade, naturalmente, era a de remunerar os advogados públicos ou privados, estes últimos nas hipóteses de terceirização da cobrança.

As dívidas ativas previdenciárias foram acrescidas de honorários até o advento da Lei nº 11.457/2007, que criou a “Super Receita”, momento a partir do qual passaram a contemplar o valor do “encargo legal”, nos termos do artigo 37-A da Lei nº 10.522/2002, incluído pela Lei nº 11.941/2009. A substituição ocorreu em virtude da centralização, na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), da representação judicial na cobrança de créditos tributários de qualquer natureza, inscritos em dívida ativa. A representação pela PGFN também motivou uniformização da forma de cobrança dos acréscimos moratórios e encargos legais que passaram à sua administração.

Pois bem. A Lei nº 11.941/2009, ao instituir as modalidades e os respectivos descontos para pagamento e parcelamento beneficiado de débitos tributários federais, determinou a exclusão de 100% do valor do encargo legal em todas as situações.

Ocorre que o entendimento da Receita Federal, espelhado nas Portarias Conjuntas PGFN/RFB nºs 06/2009 e 07/2013, é no sentido de afastar o desconto sobre o encargo legal quando se tratar de débito previdenciário. O artigo 12, § 11, inciso II, da Portaria nº 06, estabelece que o parcelamento de débitos previdenciários inscritos em dívida ativa “abrangerão, inclusive, os encargos legais e honorários devidos nas execuções fiscais”.

A interpretação restritiva é questionável, em primeiro lugar, porque tais portarias extrapolaram sua função regulamentar, na medida em que previram restrições inexistentes na lei de regência, contrariando o princípio da legalidade estrita.

Além disso, nas discussões judiciais sobre o assunto, a Fazenda Nacional tem sustentado que o desconto de 100% sobre o valor do encargo legal se aplicaria apenas às dívidas ativas previdenciárias posteriores à vigência da Lei nº 11.457/2007, já que no período anterior, incidiam os “honorários previdenciários”. Tal linha de entendimento, todavia, vai contra a proposta do programa “Refis da Crise”, assim como à intenção do legislador de padronizar a forma de cobrança dos débitos administrados pela PGFN.

O entendimento defendido pelo Fisco vem sendo afastado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que congrega os estados da região sul. A interpretação da Corte é no sentido de considerar o desconto previsto em relação ao encargo legal, também aplicável aos “honorários previdenciários”:

“A interpretação apropriada do tema não permite concluir que a Lei 11.941 dispensa o pagamento do encargo legal previsto no DL 1.025/69 e exige o pagamento dos honorários previdenciários. Isto porque ambas parcelas têm a mesma natureza e presumir que o legislador não quis abranger os honorários previdenciários é interpretação que não se coaduna com a finalidade da lei.” (AC nº 5039002-94.2011.404.7100/RS, Rel. Des. Fed. Joel Ilan Paciornik, 1ª Turma, julgado em 09.07.14)

No mesmo sentido tem se posicionado o Superior Tribunal de Justiça:

“Assim, a interpretação teleológica e sistemática da legislação em comento, sobretudo da Lei 11.941/2009, impõe a conclusão no sentido de que a não inclusão dos chamados honorários previdenciários no valor consolidado nas hipóteses em que a lei exclui o encargo legal atende à finalidade buscada pelo legislador da lei referida — incentivar a adesão ao programa de parcelamento fiscal. (…)” (Resp nº 1.430.320/AL, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, DJe de 26.08.14)

A jurisprudência atual sobre o assunto não deixa dúvida quanto à insustentabilidade da interpretação restritiva que vem sendo feita pela Fazenda Nacional, que, além de contrária ao espírito do programa “Refis da Crise”, dispensa tratamento anti-isonômico aos contribuintes que possuem dívidas previdenciárias.

2 pensou em “Refis da Crise: honorários e encargo legal sobre dívidas previdenciárias são indevidos

  1. Bom dia,
    Tendo em vista a abertura de datas para a consolidação dos débitos previdenciários / Refis da Copa, qual o procedimento devemos adotar com relação aos honorários advocaticios?
    Obrigado,
    Américo de Almeida Santos

  2. Prezado Américo, boa tarde:
     
    A interpretação da Receita Federal, em razão das Portarias Conjuntas PGFN/RFB nºs 6/2009 e 7/2013, tem sido no sentido de não aplicar o desconto quando se tratar de débito previdenciário inscrito em dívida ativa no período anterior à Lei nº 11.457/2007, época em que eram acrescidos dos “honorários previdenciários”.
    Após o advento da referida lei, que criou a “Super Receita”, foi unificada a forma de tratamento dos débitos tributários, de modo que todos (inclusive os previdenciários) passaram a ser acrescidos do chamado “encargo legal”.
     
    A Receita entende que os “honorários previdenciários” não podem receber o mesmo tratamento conferido pela Lei nº 11.941/2009 ao “encargo legal”.
    Infelizmente, a única maneira de alcançar o direito ao desconto nesses casos é através de medida judicial.
     
    Atenciosamente,
     
    Janaina Baggio

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