Novo capítulo da guerra fiscal do ICMS: uma proposta de cessar fogo

Por Michelle Heloise Akel.

Foi publicado no último dia 30 de julho (e republicado no dia 31) o Convênio ICMS do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) nº 70/2014. Com ele, logo se anunciou por parte da mídia o fim da guerra fiscal do ICMS. Contudo, como se verá da análise das cláusulas do convênio, trata-se de uma proposta de acordo entre os estados signatários que para produzir efeitos práticos concretos, além de medidas a serem adotadas pelos mesmos, depende de outras situações externas.

Pelo convênio, ficam remitidos e anistiados os créditos tributários do ICMS, constituídos ou não, relativos a operações e prestações, decorrentes de parcela alcançada por benefícios e incentivos, fiscais e financeiros, concedidos por legislações tributárias estaduais e distrital editadas até a data de publicação do convênio, sem aprovação do CONFAZ. Ou seja, ficam perdoados os débitos do ICMS originários da concessão de benefícios fiscais e financeiros sem anuência do CONFAZ, portanto, relativos tanto valores dispensados indevidamente pelas unidades concedentes, quanto pertinentes aos estornos dos créditos do imposto nos estados de destino das mercadorias, em operações interestaduais. Estão dentro da remissão e anistia, inclusive, os incentivos e benefícios, fiscais e financeiros, que tenham sido objeto de declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal.

Contudo, o perdão desses débitos tributários do ICMS, está condicionado ao cumprimento de uma série de exigências e providências pelos estados e o Distrito Federal, pelo Congresso Nacional e pela própria União Federal, o que revela seu caráter de carta de intenções sem, ainda, força prática imediata.

Aos estados signatários (lembrando que não foram todas as unidades federadas a aderir), pelos termos do convênio, exige-se transparência e a vedação à outorga de novos benefícios fiscais sem aprovação no CONFAZ. Nesse sentido, impôs-se que os estados, em até 90 (noventa) dias da data de produção de efeitos deste convênio, publiquem, nos seus respectivos Diários Oficiais, relação contendo a identificação de todos os atos normativos relativos a incentivos e benefícios, fiscais e financeiros, concedidos e efetuar o registro e o depósito, junto à Secretaria Executiva do CONFAZ, da documentação comprobatória correspondente aos seus atos concessivos.

Com dita publicação e registro junto ao CONFAZ, fica a unidade federada autorizada a concedê-lo ou prorrogá-lo por prazos que variam de 1 (um) a 15 (quinze) anos, conforme a natureza do incetivo.

Note-se, a tal propósito, que dentro do escopo do convênio, admite-se que os benefícios e incentivos fiscais já concedidos (e cujos atos tenham sido publicados e depositados no CONFAZ) possam ser estendidos, sob as mesmas condições e prazos limites de fuição, a outros contribuintes estabelecidos nos respectivos estados e ainda não beneficiados; também, se admite aos estados aderir aos benefícios e incentivos concedidos ou prorrogados por outra unidade da mesma região.

Acordaram as unidades signatárias do convênio em não reconhecer os créditos de ICMS referentes às operações e prestações contempladas por incentivos e benefícios, fiscais e financeiros, que não tenham sido publicados, depositados e registrados junto ao CONFAZ. Anuiram, igualmente, os estados e o Distrito Federal em não conceder ou prorrogar isenções, reduções de base de cálculo, créditos presumidos ou qualquer outro incentivo, vinculado ao ICMS, sob pena de tornar sem efeitos as disposições do Convênio nº. 70, relativamente àquela unidade federada concedente.

As providências e exigências contidas no convênio para que seus efeitos sejam produzidos não ficam por aí. A produção dos efeitos do convênio são condicionadas, ainda, a medidas a serem adotadas pelo Congresso Nacional, quais sejam, cumulativamente: (a) à edição pelo Senado Federal de resolução que estabeleça a redução gradual da alíquota do ICMS, nas operações e prestações interestaduais; (b) à promulgação de emenda constitucional que promova a repartição, entre o estado de origem e o estado de destino, do ICMS incidente sobre as operações e prestações interestaduais que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto, aplicando-se nessa hipótese a alíquota interestadual, cabendo ao estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre as alíquotas interna do estado destinatário e interestadual; e (c) à aprovação de lei complementar que disponha sobre a instituição de fundos federativos, com recursos da União, considerados como transferências obrigatórias, para compensar as perdas dos estados com a redução das alíquotas do ICMS e com a repartição do imposto entre estados de origem e de destino do ICMS nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.

A produção de efeitos do convênio condiciona-se, outrossim, à edição de legislação e a adoção pela União dos novos critérios de atualização monetária e de fixação dos juros nos contratos de refinanciamento celebrados entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, com base nas Leis nº 9.496, de 11 de setembro de 1997, e 8.727, de 05 de novembro de 1993, e na Medida Provisória n. 2.185-35, de 24 de agosto de 2001.

A celebração do Convênio CONFAZ nº 70 corresponde, assim, ao primeiro passo em direção, não só, de uma “paz fiscal”, mas de uma verdadeira reforma relativa ao ICMS, com a redução da carga tributária nas operações interestaduais e a mudança da tratativa nas operações interestaduais que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto. Aguardemos os próximos capítulos.

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