Novas regras de declaração do Beneficiário Final.

Isadora Boroni Valério Simonetti

Recentemente foi publicada a Instrução Normativa RFB nº 2.290, de 30 de outubro de 2025, que altera a Instrução Normativa RFB nº 2.119/2022, moderniza e aprofunda as regras anteriormente estabelecidas pela Instrução Normativa RFB nº 1.634/2016, e impacta diretamente as rotinas dos processos de divulgação das informações relativas aos beneficiários finais de pessoas jurídicas e outros arranjos legais e, consequentemente a manutenção da conformidade cadastral das entidades.

As inovações trazidas pela nova norma visam aumentar a transparência, aprimorar os mecanismos de fiscalização e combate a crimes financeiros, e alinhar o Brasil às melhores práticas internacionais. A compreensão detalhada dessas mudanças é fundamental para garantir a regularidade cadastral e evitar as penalidades previstas. Haverá uma maior frequência na prestação dessas informações e um maior rigor no controle.

Essa obrigatoriedade será aplicável às sociedades civis e comerciais, associações, cooperativas e fundações, inclusive as suspensas e inaptas, domiciliadas no País e inscritas no CNPJ. Também deverão cumprir a norma as instituições financeiras, administradores de fundos de investimento, entidades ou arranjos legais (trusts) domiciliados no exterior que sejam titulares de direitos, exerçam atividade ou pratiquem ato ou negócio jurídico no País para os quais seja obrigatória a inscrição no CNPJ. 

Preparamos uma breve análise comparativa entre o regime anterior e as novas disposições que entrarão em vigor a partir de 1º de janeiro de 2026

Quadro Comparativo: Principais Alterações

Característica Norma Anterior
(IN 1634/2016)
Nova Norma
(IN 2.290/2025)
Instrumento de
Declaração
Documento Básico
de Entrada (DBE)
via Coletor Nacional.
Formulário Digital
de Beneficiários Finais
(e-BEF), via Portal de
Serviços Digitais da RFB.
Forma de
Apresentação
Preenchimento manual
de uma ficha específica
(código 267).
Formulário pré-preenchido
pela RFB, com necessidade de conferência e complementação pelo declarante.
Assinatura Assinatura do
representante legal
da entidade.
Assinatura digital
obrigatória da entidade
e de cada beneficiário
final inscrito no CPF.
Prazos de
Atualização
Prazo único para a primeira adequação (31/12/2018). Prazos dinâmicos: 30 dias após a inscrição, alteração
ou desenquadramento da
dispensa, e uma declaração anual de manutenção.
Cronograma
de Adesão
Obrigação geral para
todas as entidades a
partir de 2017.
Implementação
progressiva (2026-2028), baseada no faturamento
e tipo de entidade.
Responsabilidade
Penal
Não havia menção
expressa na norma.
Tipificação expressa:
a prestação de informação
falsa configura, em tese,
o crime de falsidade
ideológica.
Guarda de
Documentos
Não havia prazo definido
na norma.
Obrigação de manter
a documentação
comprobatória por 5 anos.
Fundos de
Investimento
Tratamento genérico, com
dispensa para fundos
regulamentados pela CVM.
Obrigações mensais
específicas para
administradores e
distribuidores de cotas.

Como a Instrução Normativa RFB nº 2.290/2025 introduzirá mudanças processuais e conceituais que merecem atenção, detalhamos, a seguir, os pontos de maior impacto para as rotinas societárias:

1. O Novo Formulário Digital de Beneficiários Finais (e-BEF)

A principal inovação é a substituição do antigo procedimento via DBE pelo e-BEF, uma declaração totalmente digital que será acessada através do Portal de Serviços Digitais da Receita Federal. Essa mudança representa um avanço significativo, pois a RFB disponibilizará um formulário pré-preenchido com as informações que já constam em seus bancos de dados. Caberá à entidade e aos seus beneficiários a conferência, correção e complementação dos dados, o que exigirá uma atenção redobrada para garantir a exatidão das informações.

A exigência de assinatura eletrônica tanto da entidade quanto de cada beneficiário final (que possua CPF) é outro ponto de atenção. Essa medida aumenta a responsabilidade de todos os envolvidos e pode demandar uma nova logística interna para a coleta dessas assinaturas, especialmente em estruturas societárias complexas ou com beneficiários residentes no exterior.

2. Prazos Dinâmicos e Cronograma Progressivo

O sistema de prazo único foi abandonado em favor de um modelo mais dinâmico e contínuo. A partir de 2026, a apresentação do e-BEF deverá ocorrer em duas situações principais:

  • Prazo de 30 dias: Contado a partir (i) da data de inscrição no CNPJ, (ii) de qualquer alteração na estrutura de beneficiários finais, ou (iii) da data em que uma entidade anteriormente dispensada se torne obrigada.
  • Declaração Anual: Caso não ocorra nenhuma das hipóteses acima durante o ano, a entidade deverá, ainda assim, apresentar uma declaração anual até o último dia do ano-calendário para confirmar a manutenção das informações.

Adicionalmente, a norma estabeleceu um cronograma progressivo de obrigatoriedade para a apresentação do e-BEF, que se estenderá de 2027 a 2028 para determinadas entidades, com base em seu faturamento anual. 

  • A partir de 01/01/2027: entidades com faturamento acima de R$ 78 milhões, bem como as entidades estrangeiras com aplicação em mercados financeiros e as sem fins lucrativos destinatárias de verbas públicas.
  • A partir de 01/01/2028: entidades com faturamento entre R$ 4,8 milhões e R$ 78 milhões, bem como fundos de previdência/seguros domiciliados no exterior e entidades de previdência e fundos de pensão.

As entidades que não se enquadram nesse cronograma específico, incluindo aquelas com faturamento até R$ 4,8 milhões, fazem parte da regra geral e deverão iniciar a prestação de informações já a partir de 01/01/2026.

3. Aumento da Responsabilidade e Penalidades

A nova regulamentação eleva o grau de responsabilidade dos declarantes. A inclusão do art. 55-D na IN RFB nº 2.119/2022 estabelece que a prestação de informações falsas no e-BEF pode configurar, em tese, o crime de falsidade ideológica, previsto no Código Penal. Além disso, a penalidade de suspensão do CNPJ, que impede a entidade de realizar transações bancárias, foi mantida e seu procedimento de aplicação, detalhado, com a previsão de uma intimação prévia para regularização em 30 dias.

A apresentação do e-BEF em atraso sujeitará a entidade às multas previstas no art. 57 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001 por descumprimento de obrigação acessória tributária, e a comprovação da regularidade desta obrigação será exigida em diversos procedimentos, como alterações contratuais e baixa de CNPJ.

Recomendações e Próximos Passos

Diante das profundas alterações, recomendamos que todas as entidades iniciem o processo de adequação o mais breve possível. Sugerimos a adoção das seguintes medidas:

  • Revisão Cadastral Imediata: Realizar um diagnóstico completo da estrutura societária para identificar corretamente todos os beneficiários finais, conforme os critérios atualizados da nova norma, incluindo, por exemplo, a análise de sócios de SCPs e a verificação de administradores em casos específicos.
  • Verificação do Enquadramento: Determinar se a entidade se enquadra em alguma das hipóteses de dispensa ou, caso contrário, em qual etapa do cronograma progressivo de obrigatoriedade ela se insere, com base no faturamento do ano anterior.
  • Coleta de Dados e Documentos: Iniciar a coleta das informações cadastrais detalhadas de cada beneficiário final, como o Número de Identificação Fiscal (NIF) para residentes no exterior e o endereço de e-mail, e organizar a documentação que comprova a cadeia de participação societária.
  • Providenciar Certificados Digitais: Assegurar que não apenas a entidade, mas também todos os seus beneficiários finais que possuem CPF, tenham um certificado digital válido para a aposição das assinaturas no e-BEF.
  • Estabelecimento de Processos Internos: Criar um fluxo de trabalho interno para monitorar continuamente qualquer alteração na estrutura de beneficiários finais, a fim de garantir o cumprimento do prazo de 30 dias para atualização, bem como para assegurar a entrega da declaração anual.

A transição para o e-BEF e as novas regras de declaração do beneficiário final representam uma evolução natural no movimento global por maior transparência corporativa e fiscal. Embora a nova sistemática traga mais complexidade e responsabilidades, ela também oferece a oportunidade para as empresas revisarem e fortalecerem suas estruturas de governança.

Nosso escritório está à inteira disposição para auxiliá-los na interpretação da nova legislação, na revisão de suas estruturas societárias e no planejamento para a completa adequação a esta nova obrigação acessória.