POR Fernanda Gomes
Fernanda Gomes
A Lei nº 12.216/1998 criou o Fundo de Reequipamento do Poder Judiciário – Funrejus, com o intuito de suprir o Poder Judiciário Estadual com os recursos financeiros necessários para fazer frente às despesas com suas operações.
Para tanto, foram instituídas Taxas Funrejus, exigidas, além de outros, nos atos praticados pelos cartórios de protesto de títulos, registro de imóveis e tabelionatos, à alíquota de 0,2% sobre o valor do título do imóvel ou da obrigação.
Trata-se, assim, de tributo da espécie taxa, exigido pelo exercício do poder de polícia, sobre atividades notariais.
Até a edição da Lei nº 18.415/2014, a cobrança da Taxa Funrejus nos atos praticados pelos cartórios envolvendo bens imóveis ou obrigações possuía um limite máximo: o dobro do teto de recolhimento das custas fixadas no Regimento de Custas, que perfaz atualmente o valor de R$ 2.111,20 (dois mil cento e onze reais e vinte centavos).
No entanto, com a publicação da referida Lei, foi retirado o limite de valor exigido a título de Taxa Funrejus, restando a cobrança de 0,2% sobre o valor do título do imóvel ou obrigação.
Ao assim fazer, tal exigência passou a ser inconstitucional por dois motivos. O primeiro deles diz respeito ao fato de as taxas pelo exercício de poder de polícia serem tributos que não podem ter base de cálculo própria de imposto, conforme previsto no art. 145, § 2º, CF, e art. 77, do CTN.
Como visto, a taxa Funrejus tem como base de cálculo o valor do título do imóvel ou da obrigação, que é a mesma base de cálculo do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI, definida pelo própria Constituição Federal, em seu art. 156, II.
Assim, nos termos da atual legislação, ao realizar a transferência do registro de um imóvel ou realizar uma incorporação, o sujeito passivo recolheria 2,7% de ITBI e 0,2% de Funrejus sobre o valor do imóvel, totalizando 2,9% sobre o valor da transação, o que ofende a Carta Magna, em razão da identidade entre as bases de cálculo.
Além disso, do arquétipo constitucional das taxas pelo poder de polícia, extrai-se a necessidade de observância ao seu caráter de retribuição – e eis aí o segundo motivo. Isso porque as taxas devem conter relação com o valor do serviço prestado, já que são cobradas para custeio dessas atividades. Assim, o valor cobrado pelo serviço deve ter equivalência direta com o custo real do serviço ou do proveito do contribuinte.
O autor Roque Antonio Carraza, tratando da impossibilidade de as taxas terem base de cálculo idêntica à dos impostos, assim consigna: “Tendo a taxa, por hipótese de incidência, sempre uma atividade estatal diretamente dirigida ao contribuinte, sua base de cálculo deverá, sob pena de desvirtuamento do tributo, exibir, forçosamente, a medida da intensidade da participação do estado. (…) Conquanto não seja necessária uma perfeita coincidência entre o custo da atividade estatal e o montante exigido à título de taxa, deve haver, no mínimo, uma correlação entre ambas.”
Portanto, a exclusão do limite do valor cobrado fez com que a Taxa Funrejus deixasse de ter relação direta com a atuação estatal, tornando-se, na verdade, um adicional do ITBI.
Analisando caso em que se exigia Taxa Funrejus superior a R$ 130.000,00 (cento e trinta mil reais), assim entendeu o Juízo da 4ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba: “A partir do momento em que houve exclusão da limitação quantitativa do tributo, passou a taxa a recair sobre o valor do título do imóvel ou da obrigação nos atos praticados pelos cartórios, de forma indiscriminada. Sendo assim, deixou-se de manter a correlação do cálculo com o custo da atividade prestada, o que vai de encontro à lógica da taxa”.
Cabe destacar que o Tribunal de Justiça do Estado Paraná ainda não se manifestou sobre o mérito da discussão, tendo em duas oportunidades rejeitado ações sobre essa discussão por questões processuais.
Até o presente momento, são poucos os casos que já possuem decisão e, ainda assim, não definitivas, mas a discussão é consistente, conforme fundamentos antes apontados.